quinta-feira, 28 de maio de 2015

Que tal TVs voltarem a pagar ICMS?

Por Helena Sthephanowitz, na Rede Brasil Atual:

Em tempos de ajuste fiscal, quando se procura o equilíbrio entre a arrecadação e as despesas, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), encontrou-se com governadores e propôs incluir na agenda parlamentar o chamado pacto federativo. Na prática, os estados e municípios reclamam uma maior fatia do bolo dos impostos para si, reduzindo a fatia do governo federal.

Mas não há como redistribuir o bolo sem dividir também as responsabilidades pelas despesas definidas na Constituição Federal de 1988. Para citarmos um exemplo, de nada adianta para o cidadão ver verbas aumentadas para o município ao custo da redução de sua aposentadoria paga pelo INSS, um órgão federal.

Assim como o Ministério da Fazenda busca aumentar a arrecadação, seja através do aumento da alíquota da Contribuição Social Sobre o Lucro dos bancos, taxação de importados e retirada de alguns estímulos de desoneração usados para enfrentar a crise mundial, os estados e municípios podem procurar soluções semelhantes.

Um caso claro de perda de receita indevida é a imunidade concedida a grandes empresas de TV e rádio para não pagarem o Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Este é um imposto dividido exclusivamente entre estados e municípios e nenhuma parte vai para União.

Nós, que não somos bilionários na revista Forbes, pagamos ICMS na conta de telefone, na conta da banda larga e na assinatura da TV a cabo. Mas as redes de televisão abertas, cujos donos são quase todos bilionários, não pagam nem um centavo de ICMS sobre o que ganham para transmitir a mensagem comercial do anunciante ao telespectador.

Nisto o lobby dos "barões da mídia" sempre foi forte dentro do Congresso Nacional. Quando parlamentares não são os próprios donos de tvs e rádios, quase sempre preferem bajular os donos da mídia concedendo estas benesses legislativas.

Na Constituição imposta pela ditadura, de 1967, competia à União instituir imposto sobre serviços de transporte e comunicações. Assim a radiofusão comercial deveria pagar o Imposto sobre Serviços de Transportes e de Comunicações - ISTC. Os anos se passaram e nada de regulamentar a lei para cobrar o imposto das emissoras. Só no apagar da luzes da ditadura, em 20 de dezembro de 1984, o Decreto Lei nº 2.186 regulamentou, mas não para cobrar, e sim isentando a televisão e o rádio.

Com a redemocratização, a Constituição Federal de 1988 passou este imposto para competência estadual. Os serviços de comunicação comercial passariam a pagar o ICMS, inclusive as emissoras abertas sobre os anúncios que veiculassem, apesar de muitas tentativas de interpretar juridicamente que o imposto não alcançaria a radiofusão.

O lobby da mídia voltou-se para as Assembleias Legislativas e para os governadores. Vamos pegar o exemplo do que ocorreu no Rio de Janeiro, sede da maior rede nacional de televisão. A lei estadual nº 1423, de 27 de janeiro de 1989, estendeu para a radiofusão a imunidade que a Constituição Federal só dava aos jornais, livros e revistas.

Quando Leonel Brizola assumiu o governo fluminense pela segunda vez, ingressou com uma Ação de Inconstitucionalidade, Adin 773, no Supremo Tribunal Federal, em 1992, contestando, pois imunidade tributária só poderia ser concedida a partir da Constituição Federal. O pleno do STF julgou em caráter liminar favorável ao governo do Rio, mas a tramitação do julgamento definitivo levou mais de duas décadas.

A ação ficou parada na gaveta do Procurador Geral da República para vistas de outubro de 1994 até fevereiro de 2002, quando finalmente Geraldo Brindeiro devolveu com o parecer pela inconstitucionalidade.

Em junho de 2002, houve troca de relator. Saiu da mãos do ministro Neri da Silveira e caiu nas mãos do ministro Gilmar Mendes. Pouco mais de ano depois, Mendes liberava a ação para entrar em pauta para julgamento, conforme publicado no Diário Oficial do dia 01 de agosto de 2003.

Mas a ação inexplicavelmente ficou engavetada por mais 11 anos sem nenhuma tramitação até ser julgada. Os ex-presidentes do STF Maurício Corrêa, Nelson Jobim, Ellen Gracie, o próprio Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Ayres Britto e Joaquim Barbosa não colocaram em julgamento. Só foi julgada em 20/08/2014 em sessão presidida pelo ministro Ricardo Lewandovsky.

Pausa para uma curiosidade. Como o mundo é pequeno, o filho do ex-ministro Joaquim Barbosa veio a trabalhar recentemente na produção do programa de Luciano Huck da TV Globo. Alexandre Kruel Jobim, filho do ex-ministro Nelson Jobim, foi diretor corporativo do grupo RBS, que possui canais de TV afiliados da Rede Globo no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.

O julgamento do STF deu ganho de causa por unanimidade para o governo do Rio poder cobrar ICMS de emissoras como a TV Globo, Record, SBT, Bandeirantes, etc. Mas a decisão chegou tarde demais, já não produzindo nenhum efeito.

Em 27 de junho de 2003, antes do ministro-relator Gilmar Mendes colocar a ADIn de Brizola em pauta para julgamento, o ex-deputado paranaense André Zacharow apresentou uma emenda à PEC da Reforma Tributária (41/2003) que colocava na Constituição Federal a imunidade ao ICMS das TVs abertas e rádios.

Pausa para outra curiosidade. Zacharow foi eleito em 2002 pelo PDT de Brizola e ainda era filiado a este partido quando apresentou a PEC. Depois migrou para o PMDB tornando-se aliado de Roberto Requião até hoje. O ex-governador do Paraná, em 2004, queria acabar com a imunidade do papel jornal à cobrança do ICMS.

Em 19 de dezembro de 2003, a PEC 41/2003 estava aprovada e, desde então, os estados não podem mais cobrar ICMS sobre a veiculação de anúncios comerciais nas rádios e TVs abertas.

Se em 2003 algumas empresas de mídia estavam em grave crise financeira, hoje grandes emissoras de TV têm lucros exorbitantes. A família Marinho, dona da TV Globo, ostenta a maior fortuna do Brasil segundo a revista Forbes. Não há mais motivo para desfrutar de um privilégio tributário que outras empresas não tem. É hora de revogar na Constituição a imunidade que a emenda do ex-deputado Zacharow criou.

http://altamiroborges.blogspot.com/

Texto replicado deste endereço: BLOG DO ILIKE CHOPIM

terça-feira, 26 de maio de 2015

Brasil, um país desconhecido pelos brasileiros

Um Brasil desconhecido de grande parte da população é tratado pela FAO como um caso de relevância internacional no combate à fome.

Najar Tubino

É um fato concreto que a versão veiculada pela mídia sobre o que acontece no país é totalmente desvirtuada e dirigida, segundo seus interesses empresariais e familiares. Em relação às políticas públicas voltadas para o combate à fome e a produção de alimentos pela agricultura familiar, que engloba trabalhadores e trabalhadoras assentadas, quilombolas, ribeirinhos, indígenas e o povo marginalizado há décadas nos nove estados nordestinos e o norte de Minas Gerais, que formam o semiárido. No final do ano passado a FAO, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, lançou pela primeira vez o relatório sobre Segurança Alimentar e Nutricional inteiramente sobre um país, no caso, o Brasil. O documento começou a circular este ano, e têm versões em português, espanhol e inglês. Internamente a notícia veiculada rapidamente dava conta que o Brasil tinha saído do Mapa da Fome.

A FAO monitora mais de 180 países nos quesitos sobre insegurança alimentar. E o Brasil, desconhecido de grande parte da população, é tratado como um caso de relevância internacional, que passou a ser um exemplo e copiado por muitos outros países por suas políticas adotadas no combate à fome e a produção de alimentos pela agricultura familiar. Como esclareceu o representante da FAO no Brasil, Alan Bojanic:

Prioridade para segurança alimentar é política

“- A conjuntura do Brasil é caracterizada pela consolidação e institucionalização de políticas bem sucedidas de combate à fome e de promoção da segurança alimentar e nutricional (SAN), norteados pelo Direito à Alimentação Adequada, da ONU. O Brasil cumpriu e ultrapassou os Objetivos do Milênio no que diz respeito à redução da pobreza e da fome”.

A questão não é técnica e sim política, como define a própria Lei 11.346/2006, que é a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional, onde está definido o significado de tudo isso:

“- É a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras da saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis. Não é um conceito técnico, é um conceito político, construído com intensa participação social”, escreve o dirigente da FAO no Brasil.

Brasil referência internacional

Por que o caso brasileiro se destaca, pergunta Alan Bojanic?

Por vários motivos: combate à fome como prioridade de Estado, sistema de governança da SAN, perspectiva do Direito Humano à Alimentação Adequada, processo participativo e intersetorial, políticas públicas articuladas e programas bem desenhados, monitoramento da SAN e convergência com a discussão internacional.

As ações funcionam em rede, tanto os programas sociais como o Bolsa Família, que em 2013 alcançou R$25 bilhões e atendeu 13,8 milhões de pessoas, mas todas as outras ações de apoio à agricultura familiar, como o PRONAF e os Programas de Aquisição de Alimentos e da Merenda Escolar, que no total somaram R$78 bilhões em 2013. Segue outro trecho do relatório Segurança Alimentar e Nutricional – Um Retrato Multidimensional, da FAO:

“- O Brasil já é hoje uma referência internacional de combate à fome. As experiências exitosas como transferência de renda, compras diretas para aquisição de alimentos, capacitação técnica de pequenos agricultores, entre outras, estão sendo transferidas para outros países. Os gastos sociais aumentaram mais de 128% entre 2000 e 2012 e a parcela no PIB aumentou 31%. O Bolsa Família que atingiu R$25 bilhões em 2013 e atendeu 13,8 milhões de famílias, sendo que o depósito é feito em nome da mãe preferencialmente e exige que as crianças permaneçam na escola e visitem os serviços de saúde.”

Estrutura fundiária concentrada

As famílias em situação de extrema pobreza, que foram o foco do programa Brasil Sem Miséria, lançado em 2011, e tornaram possível que estas famílias recebam um mínimo de renda per capita de US$1,25 por dia, segundo o relatório, retirou desta situação 22 milhões de brasileiros. Os investimentos em políticas que apoiam os agricultores familiares aumentaram 10 vezes em 10 anos, caso do PAA chegou a R$1,3 bi em 2013 e o PNAE atingiu 43 milhões de estudantes, no mesmo ano. Outra política pública ressaltada pela FAO: o acesso à terra, com a distribuição de 50 milhões de hectares a mais de 600 mil famílias nos último 10 anos, contando até 2012. Os números totais hoje em dia chegam a quase um milhão de famílias assentadas e 80 milhões de hectares.

Por fim, o Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, realizado em conjunto com a sociedade civil, está vinculado ao orçamento federal e um sistema bem estruturado de monitoramento multidimensional de segurança alimentar e nutricional. O Brasil é um país mundialmente importante na produção agrícola e diversidade de alimentos. Por outro lado, aspectos como a estrutura fundiária concentrada e a sustentabilidade do sistema adotado e o equilíbrio entre produção de commodities direcionadas para o mercado internacional e de alimentos para o consumo interno têm reflexos importantes na Segurança Alimentar e Nutricional da população e alguns grupos específicos.

Consumo excessivo de agrotóxicos e transição agroecológica

O relatório cita o fato do país ser líder na produção de laranja, cana e café, ocupar a segunda posição em soja, feijão e carne bovina, o terceiro em abacaxi e milho, o quarto na produção de leite de vaca e o quinto em limão e banana.

“- Ao mesmo tempo ainda existe uma parte da população em situação de insegurança alimentar, o que mostra que a quantidade de produção de alimentos de um país não se configura como um fator determinante no combate à fome. O mesmo ocorre nos Estados Unidos, também entre os maiores produtores de alimentos, onde quase 15% da população estão em situação de insegurança alimentar, sendo 5,7% em situação de insegurança alimentar grave”.

O relatório também registra que apenas metade das terras indígenas no país estão regularizadas e que apenas 10% dos quilombos identificados pela Fundação Palmares possuem título de terra. E faz o alerta para o consumo excessivo de agrotóxicos pela população brasileira.

“- Um terço dos alimentos consumidos na mesa dos brasileiros é contaminado por agroquímicos, sendo que mais de um quarto com substâncias proibidas para consumo no Brasil.”

Os avanços na democratização do acesso à terra em determinadas regiões e os modelos produtivos e de promoção da transição agroecológica, além da importância econômica da agricultura familiar, são questões que o Brasil precisa avançar, ainda conforme o relatório.

Dinheiro do PRONAF continuará o mesmo

Na semana passada a Confederação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (CONTAG) e seus quatro mil sindicatos espalhados no território brasileiro realizaram o 21º Grito da Terra com 80 mil pessoas mobilizadas. Os representantes da CONTAG se reuniram com a presidenta Dilma Rousseff e apresentaram uma pauta com 170 itens que foi respondida pelo governo federal. Neste encontro, o presidente da CONTAG, Alberto Broch disse à presidenta:

“- Não tenha medo de mexer no cofre dos grandes empresários, das mineradoras, mas não mexa nas populações rurais. Não mexa na reforma agrária”.

O Plano Safra da Agricultura Familiar será lançado no dia 15 de junho e deverá manter o patamar de R$25 bilhões para custeio e investimentos. O governo federal também se comprometeu a dirigir as compras públicas cada vez mais na direção da agricultura familiar. Também se comprometeu a entregar 10 mil moradias no Programa Minha Casa, Minha Vida Rural no próximo mês, uma da das reivindicações da CONTAG.

Sobre a reforma agrária, a secretária executiva do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Maria Fernanda Coelho esteve reunida no sábado, dia 23, em Recife, com os representantes da Federação dos Trabalhadores e trabalhadoras rurais – FETAPE – e anunciou que o governo federal vai assentar 120 mil famílias até 2018 – em condições qualificadas de luz, água, moradia, crédito e assistência técnica.

100 mil mulheres em agosto na capital federal

Em Recife ocorreu uma das maiores manifestações do Grito da Terra com cinco mil participantes. Eles caminharam até a sede do governo estadual, pois desde 2013 existe uma lei no estado que define ações em apoio ao povo do semiárido que até agora não receberam nenhuma resposta ou iniciativa do executivo. Os 179 sindicatos pernambucanos também reivindicam R$30 bilhões para o PRONAF e outros 20 bilhões para outros programas. Nas ruas da capital eles anunciaram o que a população brasileira precisa saber:

“- Quem coloca alimento na mesa da cidade precisa de apoio da sociedade”.

A FAO divulgou ainda nos últimos dias o relatório mundial sobre a fome, onde 805 milhões de pessoas passam por esse sacrifício todos os dias. No caso da África, um em cada quatro habitantes. Entretanto, mesmo sendo referência internacional o Brasil segue um desconhecido para os seus habitantes, porque aqui o único problema existente é a corrupção. E mais nada. Também não ficará sabendo que na última semana deste maio de 2015 acontece a Semana dos Alimentos Orgânicos com ações oficiais em 20 estados. Mas certamente vai ficar sabendo quem nos dias 11 e 12 de agosto 100 mil mulheres desfilarão pelas ruas de Brasília na 5ª Marcha das Margaridas. Essa vai ficar difícil de esconder.

Texto original: CARTA MAIOR

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Brasil, qual o seu nome?

Nos primeiros 30 anos, depois da chamada
descoberta do Brasil, os  portugueses  só
vinham ao Brasil para compra da madeira. 
Nas nossas escolas, é ensinado que o nome de nosso país de Brasil é devido ao grande número de árvores do Pau-Brasil (Caesalpinia schinata) que aqui existia na época do descobrimento e conseqüente colonização. É bom ficar claro que: o nome Brasil já existia antes da chegada dos portugueses, que os franceses e piratas de várias nacionalidades já costumavam freqüentar nosso litoral fazendo escambo (troca) com os nativos da região e a mercadoria preferida era justamente o Pau-Brasil.

Antes da chegada dos europeus

Uma das coisas que sempre é ocultada, dos nossos alunos e população em geral, era o nome de batismo do Brasil por parte dos nativos (os primeiros brasileiros). Embora os historiadores falem sobre o comércio do Pau-Brasil, eles omitem a existência de outros tipos de árvores, não levam em conta a história e não valorizam a cultura dos povos que já habitavam o Brasil.

Apesar das palmeiras cobrirem um território
maior que as árvores do Pau-Brasil, foi levado
em consideração a visão do ponto de vistas dos
europeus (portugueses).

Devido ao eurocentrismo e juntamente ao interesse pelo valor comercial do Pau-Brasil é que nossa terra passou a ser chamada pelos europeus de Brasil. Antes da chegada dos europeus os nativos utilizavam muito mais as palmeiras nas atividades cotidianas e portanto comum eles colocarem o nome da terra de PINDORAMA (Terras das Palmeiras) em homenagem as árvores que eles mais faziam uso.

Os nativos utilizavam as palhas das palmeiras (pindobas) em
quase todas as atividades da comunidade.

A lenda da Ilha Brasil

Em uma antiga lenda medieval, que circulava na Península Ibérica, se referia à Ilha Brasil, da mesma maneira da lenda da ilha perdida de Atlântida, que também era um lugar mitológico, e estaria situada no Atlântico, tendo sido representada diversas vezes em cartografias da Idade Média. Acrescentem a este fato a existência, antes do chamado Descobrimento do Brasil, de moveis fabricados com Pau-Brasil na Europa. Certamente os franceses já usavam estes moveis muito antes do Pedro Álvares Cabral descobrir (tomar posse) as novas terras.

Os diversos nomes ou apelidos


Muitas pessoas batizavam (ou apelidavam) de acordo com o que eles mais vislumbravam. Entre os animais com grande existência era a família dos papagaios. Durante muito tempo nossas terras foram chamadas de Terra dos Papagaios e até os dias atuais aprecem alguns filmes e livros com essa designação!
  • Primeiro nome do Brasil: PINDORAMA (nome dado pelos nativos);
  • Ilha de Vera Cruz (Pero Vaz de Caminha) ;
  • Terra de Vera Cruz (Pedro Cabral - 22 de abril de 1500) ;
  • Terra Nova em 1501;
  • Terra dos Papagaios, em 1501;
  • Terra de Santa Cruz - 29 de julho de 1501 (Rei Dom Manuel);
  • Terra de Vera Cruz, em 1503;
  • Terra de Santa Cruz, em 1503;
  • Terra Santa Cruz do Brasil, em 1505;
  • Terra do Brasil, em 1505;
  • Brasil - século XVII - desde 1527 - usado não oficialmente;
  • Colônia Brasil do Reino de Portugal - a partir de 1530;
  • Reino Unido de Portugal, Brasil e Álgarves (1808 - Chegada da Família Real - oficializado em 1815);
  • Império do Brasil - 1822 (ano oficial de independência política);
  • Estados Unidos do Brasil (1889);
  • Republica Federativa do Brasil (1967 até os dias atuais).

Conflito com a gramática


Sabemos que nem sempre nosso país teve este nome, Brasil, e que esse já foi alvo de transformações gramaticais, como a mudança da grafia com “z” (Brazil) para a que usamos hoje, com “s”.

Para adjetivação das palavras que representam o local onde as pessoas residem ou nasceram são usados os sufixos “ano” (paulistano), “ense” (paranaense). Esses são os procedimentos mais comuns e encontramos casos fora da regra como “SOTEROPOLITANO“ (nascidos na cidade de Salvador). Mas no caso, da adjetivação dos nascidos no Brasil, não foram utilizados esta regra e ficamos conhecidos pela profissão dos nossos antepassados. As pessoas que trabalhavam com o Pau-Brasil eram chamadas de brasileiros e isso ficou, por tradição, se repetindo até os dias atuais.

Antônio Carlos Vieira
Licenciatura Plena - Geografia (UFS)

DADOS BIBLIOGRÁFICOS:

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Brasil precisa de 'BNDES dos pobres', diz economista vencedor do Nobel da Paz

Para o economista bengali Muhammad Yunus, ganhador do Prêmio Nobel da Paz o país precisa de um "BNDES para os pobres" para avançar no combate à pobreza.

Ruth Costas - BBC Brasil

A ideia, segundo o economista, fundador do banco Grameen de microcrédito, é dar apoio para que integrantes das camadas mais pobres da população desenvolvam sua capacidade empreendedora e "criem seu próprio emprego".

"É preciso separar os serviços bancários e financeiros para os pobres daqueles voltados para os ricos, porque se você não faz isso, no final a instituição em questão acaba focando mesmo nos ricos", disse Yunus, referindo-se ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, instituição de fomento a empresas e outros negócios), em entrevista à BBC Brasil.

"Se o BNDES quer fazer isso (financiar as grandes empresas), tudo bem. Mas deve haver um BNDES para os pobres - apenas para os pobres. Assim a coisa não se confunde. Se o banco faz um pouquinho aqui, outro pouquinho ali, não funciona. É importante que as políticas e as intenções sejam claras para o financiamento dos mais carentes."

Yunus veio ao Brasil para participar de uma série de palestras e de encontros da Fundação da ONU, ONG ligada às Nações Unidas da qual é membro-conselheiro. No Insper, em São Paulo, participou de uma mesa de debate sobre a promoção da igualdade de gênero (96% dos clientes do Grameen são mulheres).

Falando à BBC Brasil sobre o Bolsa Família, Yunus opinou que é preciso garantir que as pessoas que recebem recursos do programa possam empreender e "caminhar com suas próprias pernas".

"Ajudar as pessoas que passam necessidade deve ser uma prioridade para a sociedade. Mas depois que você fez isso, há uma segunda tarefa que é garantir que a pessoa que recebe esses recursos possa se manter sozinha", afirmou o economista.

"Pelo que entendi, o Brasil conseguiu dar conta dessa primeira parte do trabalho. Mas agora é preciso começar a enfrentar essa segunda parte: Como fazer essas pessoas saírem do Bolsa Família e se sustentarem sozinhas, contribuindo para a sociedade?"

História

Nascido em um pequeno vilarejo em Bangladesh, Yunus estudou na Universidade de Vanderbilt, nos Estados Unidos e começou a carreira como acadêmico, no Departamento de Economia da Universidade de Chittagong.

Em 1976, criou o banco Grameen, que tinha como objetivo dar empréstimos a taxas de juros amigáveis para que pessoas excluídas do sistema financeiro tradicional pudessem abrir pequenos negócios.

A instituição foi pioneira no modelo de microcrédito e hoje empresta anualmente cerca de US$1,5 bilhões, tendo mais de 8 milhões de clientes.

O modelo rendeu a Yunus o prêmio Nobel da Paz em 2006 e inspirou projetos em 40 países.
"Eu não sabia nada sobre bancos. Então comecei a entender o que os bancos faziam - e fazer o oposto. Eles emprestavam para os homens, começamos a emprestar para as mulheres. Eles atuavam no centro da cidade, fomos para as áreas rurais. Pediam garantias, nós não. Tinham muitos advogados, nós não tínhamos nenhum. Somos o único banco no mundo que não tem advogado", contou o bengali em São Paulo.

Em 2011, porém, o economista teve de deixar a direção do banco após uma longa desavença com o governo de Bangladesh, dono de 25% das ações da instituição.

Empresas sociais

Hoje, ele está à frente de dezenas de empresas e fundações que oferecem serviços e produtos para os pobres em seu país, ou procuram difundir as ideias defendidas pelo economista.

Yunus diz que seu objetivo não é obter lucro, mas "resolver problemas sociais".
"Se você sempre faz e pensa as coisas de modo convencional, só consegue resultados convencionais", disse o economista, ao comentar o aumento da desigualdade no mundo.
"Como ter outros resultados? Mude de direção, dê uma marcha ré. Estamos fazendo isso no mundo dos negócios: em vez de adotarmos como objetivo ganhar dinheiro, ter lucro, nosso objetivo agora é resolver problemas. Com isso temos o que chamamos de 'negócios sociais'".

Em 1997, por exemplo, o Prêmio Nobel ajudou a criar uma companhia de telefone para vender a baixo custo celulares a pessoas pobres. Também fundou empresas na área de energia e na área médica.

Além disso, em 2006 o Grameen fez uma parceria com a Danone para criar um iogurte de baixo custo com nutrientes que faltavam na dieta das crianças das áreas rurais de Bangladesh.

Parte do objetivo de Yunus em sua viagem ao Brasil era impulsionar no país esse modelo de “negócio social” — ou seja, empresas sustentáveis que tem como propósito maior melhorar a vida e resolver problemas da população carente.

A Yunus Negócios Sociais atua no Brasil há cerca de dois anos com o objetivo de apoiar técnica e financeiramente empreendedores com propostas nessa linha.

Créditos da foto: University of Salford Press Office

Texto original: CARTA MAIOR

terça-feira, 19 de maio de 2015

Onze erros comuns entre os professores de Geografia

Todos os profissionais estão sujeitos a erros e, com os professores, não é diferente. Portanto, a grande virtude de um profissional da área da educação não é a infalibilidade, mas a capacidade de procurar e reconhecer os próprios erros e dificuldades de modo a evitá-los e, assim, tornar-se cada dia melhor naquilo que faz.

O objetivo deste texto não é o de apontar erros como se fossem um defeito grave, mas sim o de enumerar os principais problemas dos professores de Geografia para que os educadores dessa importante área do conhecimento possam aperfeiçoar-se.

Confira, a seguir, os onze erros mais comuns cometidos entre os professores de Geografia:

1) Não esclarecer o conceito da Geografia e seus objetivos

Não são poucos os mitos e enganos sobre o que é, especificamente, a Geografia. É claro que essa questão não possui uma definição única e precisa, haja vista que é amplamente debatida pelos principais pensadores da área e, eventualmente, redefinida. No entanto, cabe sempre ao professor de Geografia o esclarecimento sobre o que é a Geografia e o que ela estuda e, por extensão, o que ela não é e o que ela não estuda.

O grande erro dos professores de Geografia é realizar essa tarefa em apenas uma aula, durante um período específico do ano. Sempre que possível e necessário, é preciso lembrar aos alunos que a Geografia é a ciência que estuda o espaço geográfico, que aborda os seus aspectos naturais e humanos e que se baseia em importantes conceitos, como o de paisagem, espaço, lugar, região, território e muitos outros.

Não são raros os estudantes que se perguntam: como pode uma mesma disciplina estudar, por exemplo, as configurações geopolíticas do planeta e, ao mesmo tempo, as dinâmicas das formas de relevo? Para o professor de Geografia, cabe a missão de explicar que esses temas fazem parte de um mesmo conjunto socioespacial que está diretamente relacionado com as práticas humanas.

2) Não contextualizar informações e conceitos

Esse não é um erro exclusivo dos professores de Geografia, mas de várias áreas do conhecimento. É amplamente sabido que um conceito ou tema qualquer, explicado de forma isolada, é muito mais dificilmente compreendido do que se a sua explicação fosse realizada a partir de um contexto.

O aluno consegue assimilar melhor um determinado assunto quando ele vê que aquele conhecimento não foi apresentado em sala de aula de forma aleatória, mas que existem debates e discussões sobre esse tema. Então, antes de introduzir uma determinada matéria ou até um conceito muito específico, é bom apresentar uma contextualização, que pode ser uma matéria de jornal, um artigo de opinião, uma reportagem na TV ou até a fala do próprio professor sobre uma história, uma curiosidade, entre outras inúmeras opções.

3) Colocar os alunos para decorar as capitais dos estados e dos países

É verdade que esse procedimento é realizado cada vez mais raramente, mas ainda ocorre. Um professor não deve colocar os seus alunos para decorar aleatoriamente as capitais de países, o que se relaciona, diretamente, com o item anterior. Afinal, essa metodologia para ensinar um conhecimento, que é até eventualmente útil, apresenta-se de forma mecânica e descontextualizada.

Mais do que decorar quais são as capitais dos países e dos estados brasileiros, é importante ensiná-las de forma transversal, ou seja, ao longo dos diferentes temas. Por exemplo, quando estudamos os aspectos regionais da região Nordeste, apresentamos as capitais dos estados dessa região de maneira interligada com as demais características, o que pode gerar um maior aprendizado.

4) Esvaziar a crítica dos temas ou se limitar a criticar

Embora exista certa polêmica sobre uma possível doutrinação dos professores de Geografia em sala de aula, é errado pensar que os conteúdos devam ser trabalhados sem uma análise crítica dos fatos, o que inclui a abordagem de todas as críticas existentes sobre um determinado aspecto da realidade. Afinal, a própria crítica serve como aprendizado, pois alimenta a contextualização defendida no item 2.

Outro problema, no entanto, estabelece-se quando o professor aborda um determinado assunto somente a partir da sua crítica, privando os alunos de conceitos básicos. Um exemplo clássico: aulas sobre as disputas árabe-israelenses sem o devido aproveitamento das informações sociais e naturais da região, apenas com a opinião do professor ou com as críticas existentes sobre o caso.

Portanto, é preciso encontrar um meio-termo entre a aula não crítica e a aula somente crítica.

5) Realizar críticas e opiniões sem conhecimento ou propriedade sobre os assuntos

Ainda sobre a questão da crítica na Geografia, é importante considerar um fato: o professor não deve opinar ou realizar críticas sobre qualquer coisa se não possuir propriedade para tal. Em alguns casos, cabe mais a humildade do “não saber” do que a arrogância do “achar que sabe” para realizar considerações opinativas perante os estudantes.

Um dos erros mais comuns dos professores de Geografia é não resistir a opiniões fáceis, geralmente vinculadas ao senso comum e amplamente difundidas, mas, muitas vezes, enganosas ou reducionistas. É claro que o professor não precisa ser um “pós-doutor” sobre tudo aquilo que deseja opinar, mas é importante o mínimo de conhecimento para evitar enganos.

Aliás, uma das missões dos professores – principalmente em Ciências Humanas – é combater, entre os alunos, a difusão do senso comum, pois a maioria da população se pauta em informações vinculadas a esse tipo de saber, gerando uma série de problemas para a sociedade. Pode até dar trabalho, mas estar “por dentro dos fatos” é muito importante.

6) Trabalhar a produção e a leitura de mapas sem conteúdos e significados

Os temas de Cartografia, como se sabe, são bastante importantes para a Geografia. No entanto, alguns professores e muitos livros didáticos cometem o erro de trabalhar os mapas e os seus elementos de maneira descontextualizada. Mais do que aprender sobre os mapas, é preciso saber o que eles estão dizendo, pois o conteúdo e o significado, sem dúvidas, auxiliam uma correta leitura.

7) Não direcionar a aplicabilidade prática dos conteúdos

Em muitos casos, mais do que apresentar o contexto ou o significado de determinados assuntos e temas, os professores de Geografia precisam também demonstrar a aplicabilidade prática de alguns acontecimentos ou o porquê devemos apreendê-los. Isso não é, em muitas situações, uma tarefa fácil, mas é altamente necessária, tornando-se, assim, um desafio para quem ensina.

Muitos estudantes perguntam-se, por exemplo: “por que eu preciso estudar placas tectônicas?” Assim, nesse caso, o professor precisa esclarecer que o conhecimento sobre as placas tectônicas ajuda-nos a entender como se formam as cadeias montanhosas, por que acontecem terremotos e vulcanismos, além de explicar algumas diferenciações no relevo que interferem na nossa vivência direta.

8) Não utilizar mapas para espacializar as discussões

Se não apresentar conteúdos e conhecimentos relevantes durante o ensino de Cartografia é um erro, o mesmo pode ser dito em não apresentar mapas para espacializar os temas abordados em sala de aula. Os estudantes, quase sempre, precisam saber e entender corretamente a localização de um acontecimento para compreender melhor o que está sendo explicado.

Por exemplo: o professor afirma que o Oriente Médio é uma região onde existem muitos conflitos territoriais, políticos e também envolvendo recursos naturais, notadamente a água e o petróleo. Ao ouvir essas informações, o aluno pode perguntar-se: “Onde está o Oriente Médio?” Assim, utilizar mapas temáticos para esclarecer os diferentes pontos desse e de outros assuntos pode facilitar o aprendizado no sentido de diminuir o caráter abstrato que os conteúdos podem eventualmente adquirir.

9) Desvincular totalmente a Geografia Física da Geografia Humana

Para fins didáticos, é comum haver a separação entre a Geografia Física e a Geografia Humana no processo de ensino e aprendizagem. Até o currículo escolar, muitas vezes, apresenta essa característica. Mas isso não quer dizer que essas áreas estejam desconectadas ou, mais precisamente, que os saberes abordados por elas não estejam interligados.

A Geografia, afinal de contas, estuda, entre outras coisas, a relação entre sociedade e natureza, de modo que é impensável acreditar que os elementos antrópicos estejam desconexos dos elementos humanos. Assim, sempre que possível, o professor deve enfatizar essa complexa e abrangente relação.

10) Ignorar temas e acontecimentos atuais

O professor de Geografia não deve ignorar, em suas aulas, acontecimentos atuais, pois a realidade social é muito dinâmica. Assim, notícias e fatos – amplamente noticiados ou não – precisam ser abordados durante as aulas, nem que isso aconteça apenas de maneira introdutória. É bom também, por outro lado, que o professor consiga um equilíbrio, pois o excesso de comentários sobre notícias a acontecimentos pode atrapalhar o andamento das aulas e o atendimento do currículo escolar.

Além do mais, ao planejar uma aula sobre qualquer assunto, é bom que se pesquise a respeito de descobertas científicas ou acontecimentos recentes, pois isso pode auxiliar, mais uma vez, na contextualização defendida no item 2.

11) Ignorar fatores históricos e conhecimentos de outras disciplinas

Nos tempos atuais, a busca pela interdisciplinaridade é constante, muito embora a formação de professores e o processo de constituição das ciências apresentem limitações quanto a isso. Assim, é preciso que o professor de Geografia busque, ao máximo, romper com barreiras interdisciplinares existentes.

Nesse sentido, é importante apresentar os contextos e acontecimentos históricos de determinados assuntos, além de, ao menos, relacionar determinados temas e conceitos com conteúdos de outras disciplinas.

Esperamos que, com essa lista dos onze erros mais comuns entre os professores de Geografia, possamos contribuir para o aperfeiçoamento da prática docente dos profissionais dessa área. É claro que, em muitos casos, as falhas não são de responsabilidade exclusiva dos professores, haja vista que a falta de estrutura de algumas escolas, a má gestão ou a excessiva carga horária precarizam o trabalho docente. De toda forma, temos que considerar as nossas limitações – pessoais ou estruturais – como um desafio para melhorar não só o desempenho nas salas de aula, mas a educação em si.

Por Me. Rodolfo Alves Pena

Texto original:
Canal do Educador

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Nós e os britânicos

A principal diferença entre o sistema eleitoral brasileiro e o britânico é que o eleitor britânico pelo menos é consultado a respeito de como prefere votar

Antonio Lassance

Nem tudo está oquei no UK

O Brasil é uma República Federativa. O Reino Unido é uma monarquia parlamentar unitária. O Brasil usa o sistema proporcional e de coligações para eleger parlamentares. Os britânicos não fazem ideia do que isso seja. Seu sistema é majoritário e de eleição por distritos (650 ao todo).

A principal vantagem do sistema eleitoral britânico é o fato de ser simples. O eleitor saber exatamente que seu voto vale naquele distrito e que o eleito será quem for o mais votado individualmente.

O processo eleitoral, porém, é arcaico. Os eleitores votam em cédulas de papel, depositam o voto em uma urna que não é eletrônica e a apuração é feita no braço por pessoas que conferem voto a voto.

De vez em quando, as filas para votar são tão demoradas que, quando se encerra o horário, as pessoas que estavam do meio para o final veem as portas das seções eleitorais serem fechadas antes de chegar a sua vez. Depois de horas no frio e na chuva, voltam para casa sem terem conseguido votar.

Outro problema: quando termina a eleição, nem sempre se sabe quem governará o Reino Unido. Um partido precisa ter maioria suficiente para escolher o primeiro-ministro e formar um governo, ou deverá recorrer a uma coligação com um partido que cuspiu cobras e lagartos contra esse que agora lhe convida para montar um gabinete.

Yes, nós também temos distorções

No Brasil, não apenas os partidos, mas os especialistas se contradizem sobre os remédios a serem adotados para melhorar a qualidade da representação.

Diante de tantas incertezas e desavenças, o debate tende ao exagero. Algumas mudanças são defendidas como capazes de operar milagres, enquanto outras são vistas como o fim do mundo.

Debater apenas as regras eleitorais de votação (como se vota e como se define quem são os eleitos) é apenas tratar da ponta desse iceberg que é a política, sem descuidar da importância da ponta de qualquer iceberg.

As eleições britânicas mostraram uma clara distorção. Os conservadores formaram uma folgada maioria no Parlamento, mesmo não tendo maioria dos votos populares. Assim foi porque a regra dos britânicos é dada pela maioria dos distritos.

Não adianta criticá-los por isso com um raciocínio de sistema proporcional. No passado, antes do sistema de dois turnos, elegíamos prefeitos em um único turno mesmo que eles não tivessem a metade mais um dos votos. E é ainda assim para todas as cidades com menos de 200 mil habitantes.

São exemplos de supostas distorções, mas não existe sistema eleitoral sem risco de distorção. O Brasil tem uma regra da representação congressual, dada pelo fato de que somos um país federalista, que alguns podem considerar uma distorção. É e não é.

Estados pequenos e o Distrito Federal têm, no mínimo, oito deputados e, no Senado, qualquer um tem três senadores igualmente, independentemente da quantidade de eleitores de cada uma dessas unidades da Federação (UFs).

Há quem alerte: "o sistema distrital joga votos fora". Calma, gente. Se é assim, nós também fazemos isso. Nossa Constituição diz, em seu artigo 45, § 1º, que nenhuma unidade da Federação terá menos de oito ou mais de setenta Deputados.

Quando limitamos o mínimo e o máximo de deputados que uma UF pode ter na Câmara, distorcemos a representação e jogamos fora o voto de um monte de gente.

Isso se chama federalismo e democracia. Chama-se federalismo porque respeita o princípio de que unidades menores devem ter um mínimo, e as gigantes, um máximo, justamente para evitar uma distorção que torne os pequenos irrelevantes, e os grandes, dominadores.

Isso também se chama democracia, que não é só governo da maioria, mas respeito às minorias. A ideia de que o voto de cada pessoa é igual não funciona nem aqui, nem em democracia alguma. Sempre haverá algum tipo de distorção - o importante é que se saiba de que tipo. Cada sistema escolhe a distorção que considera mais positiva e menos prejudicial.

Lendas urbanas

Em 2002, o médico Enéas Carneiro, de um partido chamado Prona, de voz rascante e discurso raivoso, recebeu 1,55 milhão de votos. Nosso sistema deu ao fenômeno Enéas o prêmio de levar consigo mais cinco correligionários raquíticos de voto e, portanto, nada representativos.

Os menos votados do PRONA tiveram, um deles, menos de 400 votos, e outro, apenas míseros 275 votos. Ainda bem que o estado de São Paulo só pode ter 70 deputados, ou o estrago seria pior. Enéas levaria mais gente sem voto em sua cauda meteórica.

O sistema majoritário (distrital) personaliza a eleição? E o proporcional, não? O que o "exemplo" Enéas nos mostra? A força de um partido? Convenhamos.

O voto distrital aumenta o peso do poder econômico nas eleições? Mais do que o nosso sistema proporcional? Comparem os gastos de campanha no Reino Unido e no Brasil.

Sejamos realistas e busquemos argumentos mais robustos. O poder econômico não se importa se o sistema é proporcional ou majoritário. O poder econômico e seus candidatos arrumam um jeito e riem dessas filigranas.

O voto distrital vai tornar o eleito mais próximo do cidadão? Não necessariamente. A depender de outros aspectos, é improvável. Não é o tipo de sistema eleitoral que torna o eleito mais próximo do cidadão. Prefeitos de alguns municípios pequenos são eleitos por voto majoritário e muitas vezes nem moram lá. Governam morando na capital.

Os defensores do sistema proporcional dizem que o sistema distrital majoritário promove a eleição de celebridades. E o sistema proporcional, não? Clodovil, Tiririca, Romário, Popó, Marta Suplicy (que ganhou fama no programa TV Mulher, da Globo, sendo uma espécie de Ana Maria Braga para assuntos de sexualidade) e toda uma legião de futebolistas, radialistas e apresentadores de programas de tevê são o quê? Vamos falar mal de celebridades, sendo que cada partido tem as suas? E há celebridades, não muitas, que dão bons representantes - Jean Wy%u20Bllys, por exemplo, que é ex-BBB.

E quanto aos italianos, que chegaram a eleger a famosa atriz pornô, Cicciolina? Também foi pelo sistema proporcional. Ela era uma celebridade e representou um irônico voto de protesto. No Brasil, Tiririca é nossa Cicciolina.

O detalhe, ainda na comparação entre sistemas eleitorais, é que Cicciolina, que é húngara (naturalizada italiana), tentou depois a carreira política na sua Hungria, que tem sistema distrital. Não conseguiu apoio suficiente de eleitores do distrito de Kobánya para se candidatar.

Distritos e detritos eleitorais

Seria bom um debate menos apelativo e apoteótico sobre um tema que é muito restrito e que não trará nem um remédio milagroso, nem um veneno mortal. Quando se propõe a mudança do sistema proporcional para o distrital, se está falando simples e restritamente nas eleições para vereadores, deputados estaduais e federais.

Antes de se mudar o sistema de proporcional para o distrital, seria bom e prudente testarmos como ficariam as coisas se apenas acabassem as coligações em eleições proporcionais - essas que permitem que uma dezena de partidos se junte para eleger vereadores e deputados.

O sistema de lista aberta é aberto demais, %u20Be o tal do coeficiente eleitoral, que é um cálculo nebuloso demais para ser minimamente razoável, não é%u20B uma boa forma de se aproveitar os votos dados a todos os candidatos. Funciona mais como uma montanha de detritos que ajuda a eleger os candidatos mais improváveis e imprestáveis para a missão parlamentar.

O Senado brasileiro recentemente aprovou a proposta do tucano José Serra de voto distrital para vereadores em cidades acima de 200 mil habitantes. A proposta de Serra é mais uma asa de morcego na confusão que é a geleia geral do sistema político brasileiro.

E o povo assiste a tudo sem ser consultado

Todo sistema eleitoral tem vantagens e desvantagens. O britânico tem distorções? O brasileiro também. A principal diferença é que o eleitor britânico pelo menos foi consultado a respeito de como prefere votar e eleger representantes.

Ingleses, galeses, escoceses e irlandeses (da Irlanda do Norte) decidiram, em 2011, se gostariam de mudar ou de manter seu sistema. Preferiram deixar como está. Certos ou errados, os britânicos não quiseram outra coisa no lugar.

No nosso caso, a maioria dos cientistas políticos, dos políticos, dos partidos e dos comentaristas de imprensa acha que o assunto é "muito complexo" para ser decidido em plebiscito - no máximo, quem sabe, poderia rolar um referendo. Mas nem referendo acontece.

Votos e distritos são um assunto que diz respeito ao eleitor. É dele o voto. É ele quem mora no distrito. É ele quem vota e elege. Mas os congressistas ignoram esse princípio solenemente. Acham que o voto é um assunto apenas deles, de seu umbigo eleitoral.

Por isso, toda e qualquer proposta de reforma mais ampla acaba sendo sabotada pela maioria dos que acham que plebiscito, referendo, reforma e mudanças são palavras muito perigosas - bolivarianas, cubanas, poderíamos até dizer, para chocar, suíças, em homenagem ao país que mais gosta de plebiscitos e referendos.

São mesmo ideias muito perigosas. Se o povo começar a se meter mais na política, corre-se o sério risco de as coisas melhorarem. E aí, o que seria de muitos políticos e suas legendas?

Créditos da foto: Jose Maria Cuellar / Flickr

Texto original: CARTA MAIOR

sábado, 16 de maio de 2015

A pobreza sai às ruas nos EUA mais que no Brasil

Na meca do capitalismo, 45 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza. Mas parece que os arautos do american way of life não querem ver.

José Carlos Peliano

Os críticos do país não usam óculos, resistem ou não querem ver direito, embora haja casos que merecem internação definitiva para recuperação ocular e mesmo cegueira. Não só da oposição política propriamente dita mas da midiática também. Enxergam qual país? Qual deles é o que vale?

Falar mal do país virou tônica diária dos oposicionistas. Como prato principal e sobremesa. Nem os cafezinhos nos intervalos do trabalho escapam. O país para eles afunda em corrupção e economia fraca, decadente.

Bom, mas disso tudo já sabíamos, infelizmente, desde o final do primeiro governo de Dilma. O pior é que não se cansaram, nem se cansam, querem ou ganhar no tapetão ou criar dificuldades diárias, permanentes, até secar as expectativas de aposta política e recuperação econômica.

Tentaram bandeiras, faixas, panelas, reportagens falsas, notícias mentirosas, denúncias sem provas, samba do crioulo doido como diria Stanislaw Ponte Preta nos idos dos anos 60. A baderna política na busca de perdurar imagens caricatas do governo eleito democraticamente.

O pior é que não só deturpam a realidade. Não enxergam como convém com nenhum dos olhos o que ocorre no país tampouco no vizinho que tanto adoram, onde mora o Tio Sam. Diria minha avó, para que enxergar direito se eles querem mesmo é ver errado?

Pois bem, enquanto já caem de pau sobre a performance do PIB brasileiro no 1o trimestre desse ano, com queda prevista de 0,5% em relação à leve alta de 0,1% no 3o trimestre de 2014, os EUA registraram queda de 0,2% diante de alta de 2,2% nos mesmos períodos (fonte: Federal Reserve, o banco central norte-americano).

Desaceleram ambas as economias, tendo sido o tombo mais acentuado nos EUA. O Brasil está pelo menos de farol baixo desde a 2a metade do ano passado por várias razões, inclusive pela pressão política dos empresários nacionais sobre a política econômica como tentativa de reversão do quadro sucessório.

A mesma fonte norte-americana de informação indica que ocorre naquele país um período de estagnação econômica após o curto surto de recuperação, ao qual se apegaram muitos países em dificuldades e que agora não sabem bem para onde caminhar. 

As exportações recuaram nos EUA, o que mostra a menor procura do setor externo: China em ritmo menor de crescimento, a Zona do Euro pior, às voltas com a austeridade, e os emergentes boiando meio que na expectativa. Já o consumo interno igualmente volta atrás, o que revela a atenuação dos ganhos de renda da população americana.

Guardadas as devidas e honrosas proporções, fenômeno semelhante ocorre no Brasil, apimentado ademais pela quadra difícil dos embates jurídicos com relação aos desvios na Petrobras, o resultado do pleito presidencial ainda atravessado na garganta da oposição e o ataque feroz e diário da mídia desde o ano passado. Qualquer economia sofreria o mesmo tranco.

O Bureau do Censo estadunidense informa que a população que vive abaixo do nível de pobreza de lá está em torno de 14,5% ou 45 milhões de pessoas. Como se pode imaginar que a meca do capitalismo moderno apresenta quadro tão alarmante de pobreza? Pois é o que ocorre, o que os arautos do american way of life não querem ver, se emudecem ou olham de revés.

No Brasil**, em fins de 2013, a população em estado de pobreza era de 8,8% e em estado de extrema pobreza 4%, ou 12,8% na soma, cerca de 26 milhões de pessoas. A comparação é imperfeita porque a renda limite de lá é bem superior, mas o que vale são as condições vigentes em cada país, quanto ao custo de vida, as necessidades básicas e as oportunidades de ascensão social.

Daí o tamanho da pobreza aqui ser pouco mais da metade dos EUA. Não adianta o contra-argumento de que no limite de lá caberiam muito mais brasileiros porque os ricos daqui igualmente não chegariam aos pés dos de lá. Tudo relativo.

A grande diferença, contudo, está no fato de que nos EUA o contingente pobre aumentou, enquanto aqui no país ele declina. De 2006 a 2014 nos EUA o nível de pobreza veio de 12,3% a 14,5%, sem falar no contingente de sem teto que aumenta cada vez mais nas ruas das metrópoles. Enquanto no Brasil vem de 22,6% a 12,8% no mesmo período. Isso mostra que a política econômica brasileira privilegiou a população mais necessitada, enquanto nos EUA o benefício ficou para os abastados.

Os bons reflexos da economia chegaram ao custo da cesta básica no país ajudando a recuperação da renda real dos pobres. A relação custo da cesta básica/valor do salário mínimo evoluiu de forma descendente desde dezembro de 1995 até dezembro 2014. De 91,5% a 44,9% em São Paulo e de 72,7% a 35,6% em Fortaleza.

A grande dificuldade de recuperação estadunidense em relação ao Brasil, no que se refere ao mercado interno, sem depender da evolução das transações com o exterior, é o fato de que a população trabalhadora de lá tem um peso mais acentuado para as condições do país.

Em tempos recentes a criação de empregos americanos tem sido nos setores urbanos de comércio e serviços, onde os salários são menores. Daí para que a economia se expanda há que se criar mais e novos empregos com salários maiores, o que vai exigir projetos de médio e longo prazos nos setores industriais e de alta tecnologia. Vai demandar tempo.

Aqui no Brasil nem tanto. Um reforço ao mercado interno vai consolidar o que já existe, especialmente em relação aos trabalhadores com menores salários. Com a expansão de projetos de infraestrutura o impulso fica por conta dos setores de bens de capital e intermediários, que geram valor e reproduzem mais oportunidades de negócios, renda e emprego através do chamado efeito multiplicador dos investimentos.

De onde virá o impulso gerador? O primeiro ministro chinês anunciou esta semana a intenção da China investir US$ 53 bilhões no país em infraestrutura, exatamente a área que o governo federal anunciou como prioritária para expansão de projetos. 

Além do banco dos BRICS com recursos para a mesma área e correlatas, que deve finalmente ser operacionalizado mês que vem em reunião na Rússia. Outros bilhões virão do Pré-Sal apesar da pressão de opositores que querem abrir o setor para a combalida economia americana.

Mas isso só será bem sucedido e em pouco tempo caso o ministro da Fazenda não segure mais e indevidamente as rédeas da economia brasileira. Outro da turma dos que precisam enxergar melhor o que se passa aqui e lá fora. 
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José Carlos Peliano é colaborador da Carta Maior.

**Dados do Brasil são de Vinte Anos de Economia Brasileira 1995/2014, Gerson Gomes e Carlos Antônio Silva da Cruz, Centro de Altos Estudos Brasil Século XXI.

Texto original: CARTA MAIOR

segunda-feira, 11 de maio de 2015

domingo, 10 de maio de 2015 Meritocracia e a neodireita

Pablo Villaça

A "meritocracia" é uma autoilusão de grandeza para quem acha que atingiu um patamar invejável. E é uma autoilusão de futuro possível para quem ainda o almeja.

A neodireita adora berrar que a "meritocracia" é o "sistema" ideal - e é fácil compreender por que fazem isso: é uma maneira de ao mesmo tempo justificar os privilégios de quem já tem muito (como pagar menos impostos de quem tem pouco) e de garantir que os que têm pouco não se revoltem. "Trabalhe e conseguirá o que conseguir", vendem numa estratégia publicitária. "O Estado não deve ajudar quem precisa; é melhor ensinar a pescar", repetem sempre, deixando de dizer a parte fundamental que se segue: "A não ser claro, que quem 'precisa' for eu através de créditos de financiamento reduzido do BNDES, de 'bailouts' caso minha corporação quebre, de liberdade para comprar mandatos parlamentares e (de novo) de impostos reduzidos".

É inacreditável perceber como o candidato desta neo-direita pode repetir o mantra da "meritocracia" ao mesmo tempo em que toda a sua carreira se deve não aos seus esforços, mas aos de seus antepassados, que abriram seu caminho na vida pública através de cargos comissionados já na juventude, de fortunas que asfaltaram este caminho e de contatos poderosos que garantiram que a estrada estivesse sempre aberta e sem fiscalização.

O conceito de "meritocracia" é um cuspe perverso na cara de 95% da população - e o mais chocante é perceber como parte destes 90% acaba absorvendo a retórica dos 5% e defendendo-a sem perceber que está agindo contra seus próprios interesses.

O grande truque do Diabo é fazer você defender os interesses dele acreditando que são os seus. E a mídia é o braço direito do Diabo, seu chefe de relações públicas, seu agente, seu porta-voz.
Outro dia, um leitor me perguntou como eu podia ser contra a "meritocracia" se certamente havia atingido um bom status na minha profissão graças aos meus próprios esforços.

De fato, sou um privilegiado por viver da escrita e do Cinema - algo difícil em qualquer país e ainda mais complicado no Brasil, onde a cultura é sempre a primeira a ser considerada dispensável. E também me considero feliz por ter um número considerável de leitores e até mesmo de pessoas que se identificam como minhas "fãs" (embora eu sinta um estranhamento ao ouvir este termo, já que não me vejo na posição de ter "fãs").

E, sim, trabalhei e estudei muito e longamente para chegar aqui. E não pude contar com ninguém para abrir o caminho, pois não tenho parente algum que tenha trabalhado na área para facilitar a jornada.

Assim sendo, posso dizer que foram apenas meus méritos que me trouxeram até aqui e que sou um exemplo perfeito do sucesso do sistema "meritocrata"?

Até poderia - caso eu fosse extremamente hipócrita.

Pois a verdade é que tive ajuda - e muita - para chegar até aqui.

Pude estudar em escolas particulares. Pude comprar os livros que precisava. Pude alugar filmes e mais filmes e tive tempo de assisti-los. Tinha meu próprio quarto e, por não ter que dividi-lo com ninguém, podia me concentrar nos estudos e em outras tarefas (e, na adolescência, também a outras "tarefas"). Não tive que trabalhar para ajudar na renda familiar. Não tive que cuidar de meus irmãos mais novos enquanto minha mãe (viúva aos 27 anos) trabalhava fora, pois tínhamos assistente doméstica (ou, como se dizia naquela época, "empregada").

Pude fazer excursões. Pude sair com os amigos. Ir ao cinema, ao teatro. Viajar durante as férias e, assim, recarregar as baterias. Tive computador no quarto. Nunca passei fome. Pude fazer cursinho para me preparar para o vestibular.

Ao decidir largar a faculdade de Medicina (na UFMG, para a qual passei graças à possibilidade de poder me dedicar aos estudos), não hesitei em abandonar uma profissão estabelecida por outro de futuro incerto, já que, por nunca ter tido que lutar por meu sustento e por não ter uma família que dependia de mim, podia me dar ao luxo de me arriscar a tentar viver de minha profissão dos sonhos. E, durante os primeiros anos, quando não ganhava um centavo com meus escritos, pude depender do apoio financeiro de minha família.

Sim, trabalhei muito. Insisti. Perseverei.

Mas na corrida rumo ao sucesso profissional em minha área, saí MUITO na frente de pessoas que não tiveram a mesma oportunidade que eu. E que, portanto, jamais puderam competir em pé de igualdade comigo. Dizer que "venci" por ser melhor do que elas seria uma imensa estupidez. Seria crueldade. E seria mentira.

Pois o fato é que vivemos numa sociedade - e a "meritocracia" tenta ignorar isso. Tenta afirmar que TODOS têm a oportunidade de "vencer", o que é uma inverdade colossal. Mas é uma inverdade conveniente aos que já detêm o poder, pois amansa os que não detêm poder algum, mas que acabam acreditando que, sozinhos, poderão alcançá-lo.

Não posso comprar esta mentira apenas porque seria reconfortante pensar que foi apenas minha competência que me trouxe até aqui. Pois minha competência, sozinha, acabaria sendo sufocada por um contexto mais hostil.

Como disse o filósofo espanhol José Ortega y Gasset, "Eu sou eu e minhas circunstâncias; se não salvo a elas, não salvo a mim".

E não reconhecer as minhas circunstâncias seria não só uma imensa arrogância, mas uma profunda ingratidão.

Texto replicado deste blog: ESQUERDA CAVIAR


domingo, 10 de maio de 2015

EUA: Wall Street matou os empreendedores

Embora Wall Street não seja a única culpada pelo declínio do empreendedorismo nos EUA, é sem dúvida dos maiores culpados.

Yves Smith, Naked Capitalism

O número de novas empresas criadas nos EUA caiu a um ponto tão baixo que perde até para a Hungria. Mas, porque conflita com a imagem amplamente divulgada de autoconfiança dos norte-americanos, é fato ao qual a imprensa-empresa comercial oligopolista absolutamente não dá a atenção que o fato merece.

Caindo fora dos negócios 

Os EUA estão agora, não em 1º, não em 2º, não em 3º lugar, mas no 12º lugar entre as nações desenvolvidas em termos de novos empreendimentos por ano. Hungria, Dinamarca, Finlândia, Nova Zelândia, Suécia e Itália, dentre outros, têm número maior de novas empresas, em um ano, que os EUA.

Os EUA perdem em número de novas empresas per capita, e esse é hoje o problema econômico mais grave que os EUA enfrentam. Mas o “fenômeno” é tratado como segredo! Não se lê nenhuma referência na imprensa-empresa comercial, nem se ouvem políticos ou “especialistas” que digam que, pela primeira vez em 35 anos, morrem mais empresas nos EUA, do que nascem.

Até 2008, o número de novas empresas superava o número de falências comerciais em cerca de 100 mil/ano. Nos últimos seis anos, esse número repentinamente reverteu, e há hoje 70 mil empresas que fecham por ano, a mais do que o número de novas empresas.

Essa mudança é criticamente importante, porque pequenas e médias empresas são criadoras de novos empregos. Grandes corporações, tomadas em geral, estão em liquidação já há mais de uma década, economizando no número de empregados e “enxugando” sem parar por já bem mais de uma década. Pode-se ver esse comportamento na regularidade com que a imprensa de negócios publica sobre exercícios de redução de postos de trabalho como se fossem meros exercícios de redução de custos, não como o que são: sinal de o quanto profundamente as empresas e empresários não se interessam em investir nos seus trabalhadores e respectivos futuros.


Observaram que a variação nos números acompanha exatamente o andamento da crise? Não é por acaso. Embora a correlação não seja prova de causa e efeito, não é difícil perceber várias forças causais.

O artigo de Gallup insiste muito na mitologia do empreendedorismo dos norte-americanos, como se estivessem perdendo alguma espécie de valor ou de atributo louvável de caráter, como alguma velha virtude romana; insiste também na importância da “inovação”.

O problema é que essa ideia “cultural” baseia-se, ainda,. em empresas que nascem baseadas em capital abundante, muitas vezes venture-capital. Pior que isso: não só jornalistas, mas também especialistas acadêmicos fixaram-se em jovens empresas apoiadas por venture-capital – quando, na verdade, essas empresas não passaram de 1% do total de novas empresas em praticamente todos os anos, e só chegam a 25% das mais bem-sucedidas empresas de alto crescimento listadas por Inc. Magazine 500.

Assim sendo, dado que se sabe praticamente nada, o que, afinal, se sabe sob a tão mal estudada maioria das empresas iniciantes, que são o verdadeiro motor do emprego nos EUA? Como estão elas hoje?

Em seu The Origin and Evolution of New Businesses, estudo definitivo sobre o tema, Amar Bhide descobriu que o caminho mais comum seguido por empresários bem-sucedidos, foi que trabalharam para grandes indústrias e perceberam um nicho do mercado que não era bem atendido. Na ampla maioria de casos, esses novos negócios eram criados com poupança familiar, dinheiro emprestado de amigos, parentes e cartões de crédito.

A origem e evolução de novos negócios

Assim, se se pensa um pouco sobre o que está acontecendo nos EUA e no mundo empresarial em geral, vê-se facilmente o quanto o impacto da crise e seus desdobramentos estão obrigando todos que tenham cérebro capaz de operar a ter muita cautela no momento de abrir sua porta própria.

Primeiro, recessão clássica significa recuperação lenta e fraca, como todos vimos muito bem nos EUA.

O fato de que os EUA foram muito generosos e condescendentes com Wall Street cobrou altíssimo preço da Rua do Comércio, por todo o país – e de todos os pequenos negócios, principalmente. Só recentemente pequenos comerciantes exibiram algum ainda tímido sinal de otimismo quanto ao futuro e novas contratações. Mas ainda assim há áreas que ainda não dão nenhum sinal de melhoria, como a venda de varejo, um dos alvos mais populares para novas empresas.

Segundo, muita gente exauriu as próprias poupanças durante a crise, seja porque perdeu o emprego, seja porque sofreu redução nas horas de trabalho. E os idosos que ainda tenham alguma poupança têm pela frente ambiente de juros baixos e perspectiva de ganhos de capital pouco confiáveis. Embora haja quem reaja a isso com “ousadia”, muita gente responde dedicando-se a poupar ainda mais (no caso de não terem perdido o emprego), temerosos de qualquer risco. Em geral, quando as vacas andam gordas, muitos investidores são mais tolerantes em relação a assumir riscos do que em tempos incertos de vacas magras. O que implica dizer que a via de procurar amigos e família para obter financiamento para novo negócio já não é o que antigamente foi.

Terceiro, as empresas de cartões de crédito cortaram linhas de crédito durante a crise, atingindo muitos projetos de novos empreendimentos que dependiam de crédito sazonal. E duas importantes empresas de cartões de crédito que emprestavam para pequenos negócios saíram do mercado ou cortaram ofertas. Advanta faliu; e American Express, que costumava oferecer várias linhas de crédito para pequenos negócios, eliminou alguns de seus produtos e tornou-se mais seletiva com o crédito que oferece pelos cartões comerciais.

Há mais um desenvolvimento que é de mais longo prazo e foi exacerbado pela crise – os empregos temporários. É difícil ganhar insight sobre o comportamento dos consumidores, e o que teria boa chance como concorrente ou complementar de uma indústria, se você não fica tempo suficiente numa empresa, para compreender os processos e operações. Relacionado também a isso, muitas empresas obrigam os trabalhadores a assinar contratos muito restritos de não concorrência, como condição para ter o emprego, o que torna ainda mais difícil para o trabalhador não apenas encontrar empregos, mas também criar empreendimentos próprios.

Portanto, embora Wall Street não seja a única culpada pelo declínio do empreendedorismo nos EUA, é sem dúvida dos maiores culpados. E eis por que é importante não ceder no esforço para obrigar o hipertrofiado setor das finanças a diminuir de tamanho.
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Yves Smith passou mais de 25 anos na indústria de serviços financeiros e atualmente dirige Aurora Advisors, uma empresa de consultoria sediada em New York, especializada em consultoria de finanças corporativas e serviços financeiros. Sua experiência inclui trabalho na Goldman Sachs (em finanças corporativas), McKinsey & Co. e Sumitomo Bank (como chefe de fusões e aquisições). Yves já escreveu para várias publicações nos EUA e na Austrália, incluindo The New York Times, The Christian Science Monitor, Slate, The Review Conference Board, Institutional Investor, The Daily Deal e da Australian Financial Review. É graduada no Harvard College e Harvard Business School. Anima o blog Naked Capitalism desde 2006. 

Créditos da foto: Dave Center/Flickr

Texto original: CARTA MAIOR

terça-feira, 5 de maio de 2015

África: o agronegócio é a nova versão do colonialismo

Os países do G-8 querem assumir a terra do continente africano, exportando suas tecnologias e ignorando qualquer conhecimento agroecológico.

Najar Tubino

Os 53 países da África tem uma população de 1,111 bilhão de habitantes, sendo que 863 milhões moram na África Subsaariana – 34 países -, e 539 milhões continuam vivendo no campo. Mais de 90% são agricultores familiares, que as instituições internacionais insistem em qualificar de pequenos agricultores sem recursos. Além disso, 75% dos que trabalham e vivem da agricultura são mulheres, outro dado negligenciado pelas agências internacionais, como a USAID dos EUA, que está envolvida na maioria dos projetos de cooperação no continente africano. O próprio G-8 definiu há dois anos uma estratégia até 2022, para retirar 50 milhões de pessoas da situação de fome. Uma hipocrisia que de tempos em tempos os governantes ricos do planeta transformam em anúncios pomposos e planos detalhados. Este ano, por exemplo, era para ser a data em que a fome no mundo seria reduzida a metade. Isso foi anunciado no início do novo milênio.

Na verdade, o que os países do G-8 e suas agências, além é claro, das suas corporações, querem mesmo é assumir a terra do continente africano, que é habitada há milênios por comunidades de povos tradicionais e de indígenas. Parte dessa estratégia é traçar novas regulamentações nas próprias terras, iniciando o processo de regulamentação e da emissão de títulos individuais para os povos tradicionais, que obviamente, não tem documentos sobre suas terras. A USAID tem investido milhões de dólares em projetos neste sentido. Mas outra entidade chamada Millennium Challenge Corporation (MCC), criada pelo Congresso dos EUA em 2004 com o objetivo de promover o mercado livre em países pobres já investiu US$260 milhões para regulamentar as terras africanas. A rede de ONGs GRAIN, do Canadá, especialista na questão fundiária denunciou que os países africanos já promoveram 243 mudanças em suas legislações fundiárias e outras 43 na alteração do mercado de sementes.

Agroecologia é totalmente boicotada

A outra ponta da estratégia dos países ricos é implantar o agronegócio nas terras das comunidades tradicionais, para fazer o que já fazem em outras regiões, inclusive no Brasil: plantar soja, milho e algodão, cana e em alguns casos, como na África, culturas como caju, amendoim e tabaco. O pacote envolve sementes certificadas e patenteadas, fertilizantes químicos e agrotóxicos, o trio universal que tomou conta do planeta. A organização WWI (World Watch Institute), de Washington, criada pelo agrônomo Lester Brown, fez um trabalho de pesquisa de campo em 25 países africanos nos anos de 2009-2010, para o relatório lançado em 2011 – “Estado do Mundo: Inovações que nutrem”.

Os pesquisadores do WWI relataram dezenas de experiências em agroecologia na África – onde quase um milhão de agricultores trabalham com agroecologia e produção orgânica- em regiões difíceis como o Níger, a Etiópia, Mali e Malawi, que não são difundidas. Aliás, as agências internacionais não fazem a menor questão de divulgar este tipo de trabalho. Muito menos as fundações Gates, Soros, Rockefeller que definiram que a estratégia é implantar as sementes transgênicas no território africano, gastando mais de 200 milhões de dólares, se contabilizarmos os projetos de apenas duas delas – Gates e Rockefeller.

Milhões serão exilados pela mudança climática

Isso inclui criar semente transgênica de batata doce e de mandioca, duas culturas básicas na dieta dos africanos do campo. É preciso acrescentar nestas estatísticas futuras, que nos próximos cinco anos, entre 75 e 250 milhões de pessoas se tornarão exilados, em consequência das mudanças climáticas na África. As secas atingem as colheitas em dois de um período de três anos. A cada década uma seca grave. Então o problema básico dos povos tradicionais da África é a falta de umidade no solo, a falta de armazenamento da água da chuva e a inexistência de fertilidade do solo, ou seja, matéria orgânica, que em algumas regiões desapareceu. Não há pacote agroquímico no mundo capaz de resolver o problema.

Uma das fantasias criada pela Monsanto no Quênia é a promoção de uma semente transgênica lançada nos EUA em 2013, que é “resistente à seca”, e na verdade é tolerante a uma seca moderada. Coisa que qualquer semente crioula adaptada ao seu local de origem exerce em seu ciclo produtivo. Este é outro ponto que a estratégia dos países ricos pretende implantar na África. Em todos os países estão sendo introduzidas mudanças para regulamentar o mercado de sementes. Num continente onde mais de 90% da produção agrícola é familiar e tradicional, ou seja, faz parte dos costumes a troca e a partilha do conhecimento, portanto, das sementes crioulas, os agentes das corporações querem segurança para as patentes de suas marcas transgênicas.

Prosavana denunciado pelos camponeses de Moçambique

É lamentável que entre esses programas da USAID, das fundações filantrópicas norte-americanas estão iniciativas do governo Brasileiro, em projetos de cooperação técnica com vários países, especialmente Moçambique. A Embrapa desenvolve um programa de inovação agrícola em parceria com USAID em Moçambique. Existem dois projetos envolvendo a implantação do Programa de Aquisição de Alimentos e do Mais Alimentos. Até recentemente os programas filantrópicos dos EUA e da União Europeia compravam grãos dos seus agricultores para levar como ajuda humanitária à África, através do Programa Mundial de Alimentos. Agora mudaram a estratégia em parte, comprando de agricultores africanos.

Entretanto, o Prosavana é o mais conhecido dos programas a ser realizado no Corredor de Nacala, onde o ponto final é o porto, e onde uma ferrovia atravessa o norte do país. O discurso é o mesmo: ajudar a agricultura dos 4,5 milhões de pequenos produtores, melhorar a eficiência, combater a fome, mas depois de tudo isso, organizá-los em cooperativas para que se enquadrem no agronegócio e mergulhem no mercado de commodities mundial. Trabalhar para regulamentar a terra e nos projetos de reassentamentos. A Vale que explora carvão em Moatize tem uma área de 23 mil hectares e reassentou mais de mil famílias. A União Nacional dos Camponeses de Moçambique tem denunciado o Prosavana justamente por não contemplar as comunidades locais, de usurparem das suas terras e de implantar um programa sem consulta pública. Sem contar que a Fundação Getúlio Vargas estava fazendo a estruturação do Fundo Nacala, com sede em Luxemburgo e que pretendia captar dois bilhões de dólares de investidores e que receberiam seus lucros em 10 anos. Não vingou.

Algumas empresas portuguesas, da Suécia, da Finlândia, dos EUA, do Brasil já estão implantando projetos no Corredor de Nacala. Em Niassa, uma das províncias da região, o governo de Moçambique pretende incentivar o plantio de três milhões de hectares de eucalipto. Por ironia trágica, as empresas Hoyo Hoyo e Grupo Américo Amorin, além da Portucel, de Portugal, atuavam em Moçambique durante a colonização. Do Brasil o grupo Agromoz, dos Estados Unidos a Africa Century Agriculture Rei do Agro. É muito educativa a declaração da CEO do African Agricultural Land Fund, Susan Payne:

“- As terras e a mão de obra são tão baratas na África que vale a pena correr os riscos para investir”.

Programa para transformar em revendedor de agroquímicos

Na maioria dos países o governo concede licenças – no caso de Moçambique de 50 anos – para exploração por preços irrisórios, afinal, as empresas, fundos, corporações querem ajudar a combater a fome, melhorar a renda dos pequenos agricultores de parcos recursos e que necessitam da modernização da agricultura, das suas sementes transgênicas, dos seus fertilizantes químicos e de seus venenos. Um dos programas da USAID, patrocinado pelas corporações químicas é o PROFIT. Trata-se de um caso realmente engenhosos: formar agentes locais para revenda de produtos e também divulgadores das tecnologias do agronegócio. Eles treinaram milhares de agricultores na Zâmbia, que na zona rural de Mkushi, transformaram a paisagem num campo igual aos de Iowa, maior produtor de milho transgênico dos EUA. Em meio às choupanas de palha, como o relato de Andrew Rice no relatório do WWI. 

Enquanto isso, no Níger, país com 14 milhões de habitantes que enfrenta fome crônica e uma seca que devastou as criações de animais, situado na região do Sahel, os povos tradicionais fizeram uma recuperação da mata nativa, de espécies lenhosas, que em muitos casos são leguminosas, que naturalmente fixam nitrogênio na terra e conseguiram mudar o panorama numa área de cinco milhões de hectares. Isso ocorre nas regiões de Maradi e Zinder. Mesmo tipo de iniciativa o povo Dogon, no Mali, realizou. Fazendo cobertura vegetal, implantando sistemas agroflorestais e cultivando plantas nativas como painço e a espécie crioula do feijão-fradinho, além de rotação com noz de bambara, fanio e amendoim.

Sobrevivem com dignidade há milênios

Na Etiópia os povos das aldeias Wukro e Wenchi produzem mel de excelente qualidade – o país produz mais de 24 mil toneladas por ano, é o maior produtor da África -, que entrou no circuito internacional através de uma iniciativa do Slow Food International, que também já implantou mais de mil hortas comunitárias com espécies crioulas. As mulheres Massai, do distrito de Kajiado, no Quênia, construíram cisternas de ferrocimento para armazenar água, um projeto do Programa de Meio Ambiente da ONU. Em cada cisterna plantam 100 árvores.

Nos planaltos da Etiópia um grupo de agricultores descobriu e formulou um novo tipo de fertilizante usando uma planta nativa. Na mesma região onde até hoje produzem café selvagem, o mesmo que deu origem as plantações do Brasil, Colômbia e outros países.

Esta é uma realidade que não tem apoio dos governos locais todos interessados nas verbas das agências internacionais e das corporações, incluindo a elite local, que como sempre faz o seu papel de introdutor do pacote neoliberal agrovenenoso. Também não tem divulgação a não ser nos veículos alternativos ou de entidades. O pacote inclui a informação manipulada de uma realidade que só pode mudar se os povos tradicionais abrirem mão das suas terras, da sua história, enfim, da vida que levam a milhares de anos. E que agora os países do G-8, as fundações Rockefeller, Gates, Soros, Buffet, e as corporações Monsanto, Syngenta, Dupont e Bayer querem transformar, liquidando com a única coisa que eles mantiveram depois da escravidão, da colonização – a dignidade de viver de acordo com seus costumes e tradições, mesmo passando fome em muitos momentos. 

Créditos da foto: Africa Renewal / Flickr

Texto original: CARTA MAIOR

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Câmara derruba obrigatoriedade da rotulagem de alimentos transgênicos

Muitos consideram o Projeto de Lei um atentado ao direito à informação da população, cujo projeto só beneficiaria as empresas do agronegócio.

Da Página do MST

Na noite desta terça-feira (27), a Câmara dos Deputados aprovou em plenário o Projeto de Lei que prevê a não obrigatoriedade da rotulagem de alimentos que possuem ingredientes transgênicos.

Foram 320 votos a favor e 120 contra. Muitos consideram o PL 4148/2008, do deputado ruralista Luiz Carlos Heinze (PP/RS), um atentado ao direito à informação da população, cujo projeto só beneficiaria as empresas do agronegócio que querem esconder a origem do produto comercializado. Agora, o PL segue para o Senado.

Como funciona
Pela atual lei, desde 2003, todos os produtos que contêm os chamados Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) devem trazer em seus rótulos o símbolo T amarelo e a informação da espécie doadora dos genes.

O projeto 4148 pretende, no entanto, suplantar essa conquista do consumidor em favor da liberdade da indústria alimentícia de não informar o real conteúdo que disponibiliza nas prateleiras.

Com isso, a população corre o risco de consumir produtos, como óleos, bolachas, margarinas, enlatados e papas de bebê sem saber se não seguros ou não.

Retirar o símbolo T amarelo violaria o artigo 6º do Código do Consumidor, que prevê o direito à informação sobre o que se está adquirindo ao se comprar e consumir um produto.

Muitas das empresas já descumprem essa legislação e camuflam a real procedência do alimento. Atualmente, 92,4% da soja e 81,4% do milho do país são de origem transgênica.
A grande questão é que ainda não se sabe os reais riscos do uso dos transgênicos para a saúde do ser humano nem para o meio ambiente.

Porém, existe um elemento jurídico do Direito Ambiental chamado Princípio da Precaução, pelo qual o Estado tem o dever de evitar intervenções indevidas para a manutenção dos processos ecológicos em seus mais diversos âmbitos, mesmo não conhecendo seu real perigo.

Interferência do poder econômico
Numa recente entrevista à Adital, o sociólogo Rubem Siqueira, membro da Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), chamou a atenção para a interferência do poder econômico das grandes empresas privadas na política institucional brasileira.
Para ele, existe, uma estratégia do poder econômico global, cerca de seis ou oito conglomerados da indústria de tecnologia de alimentos, que pretendem controlar a cadeia produtiva mundial.

"Essas empresas, que detêm essa tecnologia, querem fazer um grande oligopólio de alimentos no mundo. Imagine o poder político que isso tem”, explicou Siqueira.
"São essas empresas que bancam os deputados que estão propondo e boa parte dos que estão votando. No submundo disso, há o financiamento de campanha. Por isso é que as campanhas, hoje, são tão caras. Quando a gente vota, não está outorgando um poder para um político baseado no que ele diz”, apontou.

"Essas empresas é quem tem o poder real. Temos a ilusão de que se está decidindo pelo voto, mas o poder econômico é que é o grande poder político no Brasil”, acrescentou o sociólogo.

O coordenador da CPT ressaltou que é obrigação do Estado garantir o acesso à informação à população. No caso dos produtos transgênicos, saber do que se trata para optarmos se queremos comprar ou não.

Texto replicado: CARTA MAIOR

Neste endereço uma cópia do projeto para quem necessite ter uma visão sem intermediação ideológicas e partidárias: