quarta-feira, 21 de março de 2018

Com educação a distância, Temer quer privatizar ensino médio

Em artigo, presidenta da APEOESP critica possibilidade do Ensino Médio ter 40% de sua carga horária ofertada no modelo a distância

ANA LUIZA BASILIO
20 de Março de 2018



Não havia exagero nenhum quando dissemos que a reforma do ensino médio do governo golpista de Michel Temer destruiria a formação dos estudantes nesse nível de ensino. A pretexto de resolver os problemas do Ensino Médio, a começar de sua falta de identidade para os estudantes (uma vez que não forma adequadamente para a continuidade dos estudos e tampouco para o mundo do trabalho), Temer optou por transformá-lo em mero estágio de formação de mão de obra, esvaziando-o de todos os conteúdos necessários à formação integral de nossos jovens para o pleno exercício da cidadania.
A Reforma do Ensino Médio nega aos estudantes o direito de acesso ao conhecimento historicamente acumulado, retirando do currículo a obrigatoriedade da oferta de disciplinas como Sociologia, Filosofia e Artes e tornando optativas Química, Física e Biologia. Ao mesmo tempo, a reforma permite que 40% do currículo seja flexível, ou seja, que se componha de conteúdos da chamada “parte diversificada”. O que defendemos, junto com outras entidades e especialistas comprometidos com a educação de qualidade, é que a parte diversificada seja de no, máximo, 30% do currículo.

Além desses absurdos, a propaganda do governo federal induz a sociedade a acreditar que os estudantes poderão traçar seus próprios itinerários formativos a partir do segundo ano, quando, na realidade, cursarão as disciplinas que forem oferecidas pelas Secretarias de Educação em cada unidade escolar. Como afirma reportagem publicada nesta terça-feira, 20 de março, no jornal Folha de S. Paulo, mais da metade dos Municípios do país só tem uma escola de ensino médio, dificultando a oferta de cinco opções para os estudantes.

Agora, de acordo com a mesma reportagem, “Temer quer 40% do ensino médio a distância”, o que significa dar um tiro mortal nesse nível de ensino brasileiro, abrindo mão de qualquer perspectiva de qualidade e de respeito aos direitos da juventude trabalhadora, que necessita da escola pública, de ter um ensino à altura de suas necessidades, condenando-os a permanecer na periferia da nossa sociedade, com grandes dificuldades para almejar postos de comando, tendo em vista a precarização de sua formação escolar básica.

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De acordo com a reportagem da Folha, a mudança seria parte de uma nova resolução do Conselho Nacional de Educação, modificando as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, que já foi totalmente desrespeitada na reforma promovida pelo ilegítimo comando do Ministério da Educação, liderado pela ex-Secretária Estadual de Educação de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro, hoje Secretária Executiva do MEC, que, lembremos, foi demitida da Secretaria de Educação de São Paulo após sucessivas investidas contra as professoras e os professores da rede estadual de ensino.

O que está por trás desse projeto é, mais uma vez, a inaceitável privatização do currículo da escola pública. O currículo é a essência do processo ensino-aprendizagem, alma do projeto político-pedagógico das escolas, definindo os conteúdos a serem trabalhados com os estudantes, metodologia, didática. A adoção da educação a distância para 40% do currículo do ensino médio vai permitir que empresas privadas vendam seus “pacotes” para as redes públicas e isso não existe em educação.

O processo educativo é uma relação dialógica entre professores e estudantes, uma troca que se dá na relação interpessoal, no ambiente escolar. As tecnologias podem ser utilizadas como meio para que esse processo ocorra e não como fim. No caso do projeto do governo Temer para o Ensino Médio, a educação a distância é um fim, cujo objetivo é conduzir a terceirização na educação pública, dinheiro público revertido para iniciativa privada. Curiosamente, quando se trata de privatização, todo o processo acontece com celeridade impressionante, o que não ocorre quando se trata da melhoria da qualidade da educação, valorização de seus profissionais e a garantia dos direitos dos estudantes.

Não vamos aceitar mais esse ataque. Se Reforma do Ensino Médio já era desastrosa para o País, com essa possível alteração, significará um verdadeiro genocídio cultural de nossos jovens filhos e filhas da classe trabalhadora.

O ensino a distância pode ser admitido como uma forma de complementar as atividades desenvolvidas pelos professores com seus estudantes em sala de aula ou, em casos muito excepcionais, como alternativa para o processo de ensino-aprendizagem em regiões remotas, de difícil acesso, como em alguns locais da Amazônia. O que pretende o governo golpista de Temer, além da óbvia desqualificação do Ensino Médio para a classe trabalhadora, é a redução do número de professoras e professores da educação pública no País, visando o enxugamento da máquina pública. Essa medida se combina com a institucionalização do credenciamento de pessoas para o magistério por “notório saber”, o que permitirá a desprofissionalização da docência e consequente aviltamento dos salários e da carreira do magistério público.

Como professora, Presidenta da APEOESP, cidadã brasileira e ex-Conselheira do Conselho Nacional de Educação, que muito contribuiu para a elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, não me calarei. De imediato, buscarei a reafirmação da aliançaentre professores, estudantes, pais e movimentos sociais para construir uma mobilização capaz de impedir que esse crime se concretize no estado de São Paulo, assim como atuarei junto à Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Central Única dos Trabalhadores (CUT) e demais entidades nacionais para que esse projeto de Temer, assim como o conjunto da Reforma do Ensino Médio, sejam definitivamente derrotados.

Professora Bebel, Presidenta da APEOESP

Texto original: CARTA CAPITAL

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