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quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

O fim da televisão como a conhecemos

A TV virará apenas uma tela de conforto, simples extensão das grandes empresas americanas da web, que detêm cada vez mais informações sobre seus usuários.

Ignacio Ramonet*


A televisão continua mudando rapidamente. Essencialmente, pelas novas práticas de acesso aos conteúdos audiovisuais que observamos sobretudo entre as gerações jovens. Todos os estudos realizados sobre as novas práticas de uso da televisão nos EUA e na Europa indicam uma mudança acelerada. Os jovens telespectadores passam do consumo “linear” da TV para um consumo de programas gravados e “à la carte” em uma “segunda tela” (computador, tablet, smartphone). De receptores passivos, os cidadãos estão passando a ser, mediante o uso massivo das redes sociais, “produtores-difusores”, ou produtores-consumidores (prosumers).

Nos primeiros anos da televisão, o comportamento tradicional do telespectador era olhar os programas diretamente na tela de seu televisor da sala, mantendo-se frequentemente fiel a um mesmo (e quase único) canal. Com o tempo, tudo isso mudou. E chegou a era digital. Na televisão analógica, já não cabiam mais canais e não existia a possibilidade física para acrescentar novos, pois um bloco de frequência de seis mega-hertz equivale a um só sinal, um só canal. Mas, com a digitalização, o espectro radioelétrico se fraciona e se otimiza. A cada frequência de 6 MHz, em vez de um só canal, podem-se transmitir até seis ou oito canais, e dessa forma se multiplica a quantidade de canais. Onde antes havia sete, oito ou dez canais agora existem cinquenta, sessenta, setenta ou centenas de canais digitais...

Essa explosão do número de canais disponíveis, particularmente por cabo e satélite, tornou obsoleta a fidelidade do telespectador a um canal de preferência e suprimiu a linearidade. Como consequência, abandonou-se a fórmula do menu único para consumir pratos à la carte, simplesmente zapeando com o controle remoto entre a multiplicidade de canais.

A invenção da web – há 25 anos – favoreceu o desenvolvimento da internet e o surgimento do que chamamos de “sociedade conectada” mediante todo tipo de links, desde o correio eletrônico até as diferentes redes sociais (Facebook, Twitter, etc.) e mensagens de texto e imagem (WhatsApp, Instagram etc.). A multiplicação das novas telas, agora nômades (computadores portáteis, tablets, smartphones) mudou totalmente as regras do jogo.

A televisão está deixando de ser progressivamente uma ferramenta de massas para se transformar em um meio de comunicação consumido individualmente através de diversas plataformas, de forma posterior e personalizada.

Essa forma de ver programas gravados se alimenta em particular dos sites de replay dos próprios canais de televisão, que permitem, via internet, um acesso não linear aos programas. Estamos presenciando o surgimento de um público que conhece os programas e as emissões, mas não conhece obrigatoriamente a grade de programação e nem sequer o canal de difusão ao qual esses programas originalmente pertencem.

A essa oferta, já muito abundante, se somam agora os canais online da Galáxia da Internet. Por exemplo, as dezenas de canais difundidos pelo YouTube, ou os sites de vídeos alugados sob demanda. Até o ponto de já não sabermos sequer o que significa a palavra “televisão”. Reed Hastings, diretor da Netflix, o gigante norte-americano de vídeos online (com mais de 50 milhões de assinantes), declarou recentemente que “a televisão linear terá desaparecido em vinte anos porque todos os programas estarão disponíveis na internet”. É possível, mas não é certo.

Os próprios televisores também estão desaparecendo. Nos aviões da companhia aérea American Airlines, por exemplo, os passageiros da classe executiva já não dispõem de telas de televisão, nem individuais nem coletivas. Agora, cada passageiro recebe um tablet para que ele mesmo faça seu próprio programa e se instale com o dispositivo da forma como achar melhor (encostado, por exemplo). Na Norvegian Air Shuttle, se vai ainda mais longe. Não existem telas de televisão no avião, nem tampouco entregam tablets, mas o avião tem internet wifi e a empresa parte do princípio que cada passageiro leva uma tela (um computador portátil, ou tablet, ou smartphone) e que basta com que se conecte ao site da Norvegian para ver filmes, séries, programas de TV ou ler jornais (que já não são mais partilhados...).

Jeffrey Cole, professor norte-americano da UCLA, especialista em internet e redes sociais, confirma que a televisão será vista cada vez mais pela Rede. “Na sociedade conectada, a televisão sobreviverá, mas diminuirá seu protagonismo social, ao passo que as indústrias cinematográfica e musical poderiam se desvanecer”, diz.

No entanto, Jeffrey Cole é muito mais otimista do que o diretor da Netflix pois afirma que, nos próximos anos, a média de tempo dedicada à televisão passará de entre 16 a 18 horas semanais atualmente para até 60 horas, dado que a televisão, segundo Cole, “vai saindo das casas” e poderá ser vista “a todo momento” graças a qualquer dispositivo com tela, apenas se conectando à internet ou mediante a nova telefonia 5G.

Também é preciso contar com a competência das redes sociais. Segundo o último relatório do Facebook, quase 30% dos adultos norte-americanos se informam por meio do Facebook e 20% do tráfego das notícias provêm dessa rede social. Mark Zuckerberg afirmou há alguns dias que o futuro do Facebook será em vídeo: “Há cinco anos, a maior parte do conteúdo do Facebook era texto. Agora, evolui para o vídeo porque é cada vez mais fácil gravar e compartilhar”.

Por sua vez, o Twitter também está mudando de estratégia: está passando do texto ao vídeo. Em um recente encontro com os analistas de Wall Street, Dick Costolo, conselheiro do Twitter, revelou os planos do futuro próximo dessa rede social: “2015 será o ano do vídeo no Twitter”. Para os usuários mais antigos, isso tem o sabor de traição. Mas, segundo Costolo, o texto, sua essência, os célebres 140 caracteres iniciais, está perdendo importância. E o Twitter quer ser o ganhador na guerra do vídeo dos telefones portáteis.

Segundo os planos da direção do Twitter, podem-se subir vídeos do smartphone para a rede social a partir de agora, início de 2015. Passará dos escassos seis segundos atuais (possibilitados pelo aplicativo Vine) até acrescentar um vídeo tão logo quanto possível diretamente na mensagem.

O Google também quer agora difundir conteúdos visuais destinados a sua gigantesca clientela de mais de 1,3 bilhões de usuários que consomem cerca de seis bilhões de horas de vídeo por mês... Por isso, comprou o YouTube. Com mais de 130 milhões de visitantes únicos por mês nos Estados Unidos, o YouTube tem uma audiência superior à do Yahoo!. Nos EUA, os 25 principais canais online do YouTube têm mais de um milhão de visitantes únicos por semana. O YouTube capta mais jovens entre 18 e 34 anos do que qualquer outro canal norte-americano de televisão a cabo.

A aposta do Google é que o vídeo na internet vai pouco a pouco acabar com a televisão. John Farrell, diretor do YouTube na América do Sul, prevê que 75% dos conteúdos audiovisuais serão consumidos via internet em 2020.

No Canadá, por exemplo, o vídeo na internet já está a ponto de substituir a televisão como meio de consumo massivo. Segundo um estudo do instituto de pesquisa Ipsos Reid and M Consulting, “80% dos canadenses reconhecem que, cada vez mais, veem mais vídeos online na rede”, o que significa que, com tal massa crítica (80%!), aproxima-se o momento em que os canadenses verão mais vídeos e programas online do que na televisão.

Todas essas mudanças são percebidas claramente não apenas nos países ricos e desenvolvidos. Também são vistas na América Latina. Por exemplo, os resultados de um estudo realizado pela pesquisadora mexicana Ana Cristina Covarrubias (diretora da empresa Pulso Mercadológico) confirmam que a rede e o ciberespaço estão mudando aceleradamente os modelos de uso dos meios de comunicação no México – em particular, da televisão. A pesquisa trata exclusivamente dos habitantes do Distrito Federal do México e abrange grupos precisos da população: 1) jovens de 15 a 19 anos; 2) a geração anterior, pais de família entre 35 e 55 anos de idade com filhos de 15 a 19 anos. Os resultados revelam as seguintes tendências: 1) tanto no grupo dos jovens como na geração anterior, as novas tecnologias penetraram em grandes proporções: 77% possuem telefone móvel, 74% possuem computador e 21%, tablet, e 80% têm acesso à internet. 2) O uso da televisão aberta e gratuita está caindo e se situa apenas em 69%, ao passo que o da televisão paga está subindo e já alcança os 50%. 3) Por outro lado, aproximadamente a metade dos jovens que assistem televisão (29%) usam o televisor como tela para ver filmes que não estão na programação de TV: assistem DVD/Blu-ray ou Internet/Netflix. 4) O tempo de uso diário do telefone móvel é o mais alto de todos os aparelhos digitais de comunicação. O celular registra 3 horas e 45 minutos. O computador tem um tempo de uso diário de 2 horas e 16 minutos, e o tablet de 1 hora e 25 minutos; e a televisão de apenas 2 horas e 17 minutos. 5) O tempo de visita a redes sociais é de 138 minutos diários para Facebook e 137 para WhatsApp; para a televisão, é de apenas 133 minutos. Se somarmos todos os tempos de visitas a redes sociais, o tempo de exposição diária à internet é de 480 minutos, o equivalente a 8 horas diárias, ao passo que o da televisão é de apenas 133 minutos, equivalentes a 2 horas e 13 minutos. A tendência indica claramente que o tempo dedicado à televisão foi rebaixado amplamente pelo tempo dedicado às redes sociais.

A era digital e a sociedade conectada já são, portanto, realidades para vários grupos sociais na Cidade do México. E uma de suas principais consequências é o declínio da atração pela televisão, especialmente a de sinal aberto, como resultados do acesso aos novos formatos de comunicação e aos conteúdos oferecidos pelos meios digitais. O grande monopólio do entretenimento que era a televisão aberta está deixando de sê-lo para ceder espaço aos meios digitais. Quando antes um cantor popular poderia ser visto por vários milhões de telespectadores (cerca de 20 milhões na Espanha) em um programa de sábado à noite, por exemplo, agora esse mesmo cantor precisa passar por 20 canais diferentes para ser visto por cerca de 1 milhão de telespectadores.

De agora em diante, o televisor estará cada vez mais conectado à internet (é o caso da França, para 47% dos jovens entre 15 e 24 anos). O televisor se reduz a uma mera tela grande de conforto, simples extensão da web que procura os programas no ciberespaço e na Cloud (“Nuvem”). Os únicos momentos massivos de audiência ao vivo, de “sincronização social” que continuam reunindo milhões de telespectadores, serão então os noticiários em caso de atualidade nacional ou internacional de caráter espetacular (eleições, catástrofes, atentados etc.), os grandes eventos esportivos ou as finais de jogos do tipo reality show.

Tudo isso não é apenas uma mudança tecnológica. Não é só uma técnica, a digital, que substitui a outra, a analógica, ou a internet que substitui a televisão. Isso tem implicações de muitas ordens. Algumas positivas: as redes sociais, por exemplo, favorecem o intercâmbio rápido de informação, ajudam a organização dos movimentos sociais, permitem a verificação da informação, como é o caso do WikiLeaks... não restam dúvidas de que os aspectos positivos são numerosos e importantes.

Mas também é preciso considerar que o fato de a internet estar tomando o poder nas comunicações de massas significa que as grandes empresas da Galáxia da Internet – ou seja, Google, Facebook, Facebook, YouTube, Twitter, Yahoo!, Apple, Amazon etc.–, todas elas norte-americanas (o que já constitui um problema em si mesmo...), estão dominando a informação planetária. Marshall McLuhan dizia que “o meio é a mensagem”, e a questão que se coloca agora é: qual é o meio? Quando vejo um programa de TV na web, qual é o meio? A televisão ou a internet? E, em função disso, qual é a mensagem?

Sobretudo, conforme revelou Edward Snowden e como afirma Julian Assange em seu novo livro “Quando Google encontrou o WikiLeaks”, todas essas megaempresas acumulam informações sobre cada um de nós a cada vez que utilizamos a rede. Informações que são comercializadas, vendidas a outras empresas. Ou também cedidas às agências de inteligência dos EUA, em particular a Agência Nacional de Segurança, a temida NSA. Não nos esqueçamos de que uma sociedade conectada é uma sociedade vigiada, e uma sociedade vigiada é uma sociedade controlada.

*jornalista espanhol. Presidente do Conselho de Administração e diretor de redação do “Le Monde Diplomatique” em espanhol. Editorial Nº: 231. Janeiro de 2015.

Tradução de Daniella Cambauva

Créditos da foto: lollopins / Flickr

Texto original: CARTA MAIOR

quinta-feira, 17 de julho de 2014

OS EUA E HITLER


(Hoje em Dia) - Um dos aspectos mais fascinantes da história, é que, por mais que se tente escondê-la, matá-la, enterrá-la, ela acaba, como um cadáver recém exumado que reabrisse as pálpebras para olhar quem o contempla, revelando, implacável e profundamente, seus segredos.

Um dos capítulos menos conhecidos, ao menos para o grande público, da história da primeira metade do Século XX, é o envolvimento de importantes nomes da elite e de grandes empresas norte-americanas com o hitlerismo, e com os crimes nazistas, incluindo a destruição e o genocídio de milhões de homens, mulheres e crianças, classificados pelos alemães como “sub-humanos” e “não-arianos”.

Segundo documentos descobertos em 2004, o avô do Presidente Geoge W. Bush, o senador - e banqueiro - Prescott Bush (1895-1972), não apenas colaborou com colaboradores do regime nazista, antes e depois da chegada de Hitler ao poder - até o ano de 1942, quando os ativos da companhia que dirigia foram tomados pelo governo norte-americano, com base em lei que proibia negociar com o inimigo - mas também que suas ligações com o magnata alemão Franz Thyssen, a quem representava nos EUA, foram fundamentais para a ascensão política e a consolidação da fortuna de sua família.

As ligações de Prescott Bush com Thyssen, e, por extensão, com o regime nazista, teriam, possivelmente, permanecido ocultas, se os Bush não tivessem sido processados em milhões de dólares, mais tarde, por danos morais e físicos, por dois ex-trabalhadores escravos do campo de extermínio de Auchwitz, que em seu cativeiro trabalharam para empresas alemãs, de alguma forma ligadas ao avô do ex-presidente dos EUA.

São conhecidas as ligações de Henry Ford, fundador da Ford Motor Company, com o antisemitismo, a ponto do inventor do Ford T ter sido condecorado por Hitler.

Mas talvez uma das histórias mais impressionantes do envolvimento de grandes ícones norte-americanos com o nazismo, seja a da IBM, a emblemática International Business Machines, que esteve ligada à Alemanha desde o início.

A IBM foi fundada por um filho de alemães, Hermann Holerith, que, trabalhando para o American Census Bureau, o escritório de estatisticas dos Estados Unidos, desenvolveu um sistema de cartões perfurados e de classificadoras mecânicas para o recenseamento populacional norte-americano, no final do século XIX.

Nascida com o nome de Tabulating Machine Company, a IBM foi fundamental para a contagem, identificação e classificação, com base em características familiares e “raciais” da população alemã e da Europa ocupada pelos nazistas.

Para isso, ela desenvolveu, sob medida, um sistema que permitiu separar e matar, rapidamente cerca de 9 milhões de vítimas, não apenas judias, mas ciganas, homossexuais, Testemunhas de Jeová, comunistas, socialistas, etc e etc. Todas identificadas, da prisão à morte, por um número tatuado no antebraço, e por um cartão perfurado com as informações relativas a cada prisioneiro.

A história, de Hermann Hollerith a Thomas J. Watson, o homem que levantou, de fato, a IBM, e a transformou em uma das mais poderosas empresas do século XX, pode ser lida, em português, no livro “A IBM e o Holocausto”, de Edwin Black, da Editora Campus. 

Texto original: Mauro Santayana

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Jornalista cubana é impedida de entrar nos EUA

Postado em: 3 abr 2013 às 21:12

Ao contrário de Yoani Sánchez, a blogueira cubana que é livre para viajar o mundo e visitar uma diversidade de países, Elaine Díaz Rodríguez, blogueira, jornalista e professora foi impedida de entrar nos EUA para um dos maiores eventos de Ciências Sociais do mundo


A tarde desta quarta-feira foi momento de mais um ataque à liberdade nas relações entre Estados Unidos e Cuba. Elaine Díaz Rodríguez, blogueira, jornalista e professora da Universidade de Havana, foi impedida de ir aos EUA para um dos maiores eventos de Ciências Sociais do mundo, o XXXI Congresso Internacional de Estudos Latino-Americanos.

Elaine teve seu trabalho aprovado pela Associação de Estudos Latino-Americanos, organizadora do evento, que também deu a ela uma bolsa para a viagem. Mesmo assim, o governo dos EUA não concedeu o visto a Elaine.

Agora, a jornalista e professora se pergunta quem cerceia a liberdade, Cuba ou os EUA? Por que Yoani Sánchez pode ir aos EUA, mas Elaine não? “Não tive nenhum problema com Cuba para sair, nunca”, disse ela ao Jornalismo B. E completou: “É humilhante que neguem vistos a acadêmicos enquanto recebem de braços abertos a Yoani (Sánchez)”.

TEXTO REPLICADO DESTE ENDEREÇO:
 http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/04/jornalista-cubana-e-impedida-de-entrar-nos-eua.html

 

sábado, 15 de dezembro de 2012

O último erro da mídia




Quatro famílias, quatro cavaleiros do apocalipse. Civita, Frias, Mesquita e Marinho. Todos crias da ditadura, de maneira que a luta contra eles configura a derradeira batalha contra o regime militar, do qual eles são herdeiros. É como se os filhos de Pinochet dominassem a mídia chilena. Ontem e hoje os grandes jornais e telejornais dedicaram-se a atacar Lula. Artilharia de todos os lados. Os colunistas, por sua vez, como sempre de mãos dadas, repetem em uníssono que Lula pode e deve ser investigado.

Acontece que Lula é alvo de uma devassa desde o dia em que foi candidato pela primeira vez a presidente da república, em 1989. Desde o início, todo o tipo de tramóia e manipulação midiática tem sido perpetrada contra ele.

Como presidente, viu seu filho ser alvo de investigações, ofensas e calúnias, viu o apartamento do seu irmão ser invadido pela própria Polícia Federal, e agora vê a mídia lhe acusar, com base em fofocas, de ser amante de sua secretária e cúmplice dela. Nada jamais se encontrou que incriminasse o ex-presidente, após tantos anos.

Com ele convalescente de um câncer na garganta, portando um edema que ainda lhe provoca dores sempre que fala muito ou se estressa, vemos a mesma mídia, que pratica todo tipo de pistolagem branca em épocas de eleições, iniciar mais uma campanha coletiva para denegrir o ex-presidente da república mais querido da história nacional.

E com que fundamentos? Com base em declarações de um bandido, de um testa-de-ferro de Daniel Dantas, cujo nome, aliás, jamais aparece nas matérias que tratam de Marcos Valério. É este o banqueiro, provavelmente, a que Lula se refere quando falou, em Paris, sobre a proteção da imprensa a determinadas figuras do mercado financeiro.

O plano já está montado. Produzir uma atmosfera de “comoção nacional”, pressionar o Ministério Público a abrir uma investigação sem provas, e depois achacar o Judiciário em busca de uma condenação baseada apenas em “indícios” e “ilações”, as quais são fornecidas gratuitamente por editoriais e colunas.

O editorial do Estado de hoje traz aquele tom imperioso da casa grande.

O jornal tem o direito de opinar como bem entender. O problema não é esse, e sim a fragilidade da República em se submeter às orientações de uma mídia reacionária e comercialmente tendenciosa. Por que uma apuração se impõe? O que são as intrigas de Marcos Valério em comparação ao volume gigante de provas existentes no escândalo da privataria tucana, onde, aí sim, há valores mastodônticos, propinas sensacionais, atos de ofício em profusão, provas, documentos, e, mais importante, trágicos e irreversíveis danos ao interesse nacional?

Confiram esse trecho do editorial, onde o Estadão ameaça explicitamente o procurador-geral da República, Roberto Gurgel:


A decisão cabe ao procuradorgeral Roberto Gurgel. Ele vai esperar o término do julgamento do mensalão, na próxima semana, para resolver se tomará a si a incumbência ou se a encaminhará a uma instância inferior do organismo, dado que Lula, ex-presidente, não goza de foro privilegiado. Estará decepcionando quem passou a admirá-lo pela atuação que teve no caso do mensalão, se decidir pelo arquivamento das denúncias. Pressões nesse sentido não faltarão.

Ontem o Globo noticiou que Cachoeira, ao ser solto pela enésima vez pelo sempre solícito desembargador, Tourinho Neto, declarou que é o “garganta profunda do PT”. Faltou ao jornal comentar o seguinte: que Cachoeira SEMPRE foi o garganta profunda do PT, porque seus interesses estão ligados aos adversários do partido. Quem eram os aliados maiores de Cachoeira: Marconi Perillo, governador de Goiás pelo PSDB; e Demóstenes Torres, senador pelo DEM.

Valério construiu sua fortuna em cima de serviços prestados a figurões do PSDB. O que a justiça precisa investigar são as relações entre ele e Daniel Dantas. Os recursos de Dantas saíram de cofres controlados pelo Opportunity, que por sua vez emergiu do processo de privatização como controlador de um dos maiores e mais lucrativos complexos de telefonia no mundo. Foi Dantas que deu o dinheiro para a SMPB de Valério, através de contratos milionários de publicidade, os quais abriram ao empresário acesso a crédito ilimitado junto às instituições financeiras.

Valério, Cachoeira e Daniel Dantas são bandidos que atuavam na seara política e são indivíduos tremendamente astutos. Em comum: são adversários do partido dos trabalhadores e entendem que, na atual conjuntura política, o melhor para eles sempre foi desviar a indignação pública para os figurões do PT.

A manipulação surge em toda parte, não dá nem para linkar e comentar tudo no blog. Está além das minhas forças. Em primeiro lugar, a repetição. Em toda matéria que trata de qualquer assunto, o jornal repete as acusações de Marcos Valério. O Instituto Lula organizou um grande seminário na França, cujos debates repercutiram no mundo inteiro, mas quando se referem ao discurso de Lula, a imprensa brasileira primeiramente abre os artigos com longos prefácios sobre as recentes acusações de Valério.

*

Entretanto, o grande erro da mídia é acreditar que poderá destruir o símbolo. Ora, isso apenas ocorreria se fosse possível forçar os brasileiros vomitarem todo alimento consumido desde 2002; a devolverem todos os recursos do Bolsa Família e tudo que com eles adquiriram; a devolverem as casas que compraram; a renegarem a esperança que lhes encheu de otimismo e alegria desde então.

Muito se fala sobre ética e moral, mas tudo que vem desses moralistas a soldo pode ser lançado ao lixo. Ética e moral são conceitos filosóficos profundos, cuja verdadeira apreensão precisa de um sentimento autêntico de amor ao povo, ao homem e às suas dificuldades. Moralista de jornal é muito mas muito pior que filósofo de botequim! Em geral, é um diletante sem alma, um intelectual que há tempos vendeu suas habilidades a quem lhe pagou mais.

*

Para escrever esse post, reli o capítulo de Suetônio que fala de Júlio César. Para quem não sabe, Júlio César pertencia ao partido popular, que era a esquerda da época. Era aliado dos tribunos e sua força residia, sobretudo, no prestígio de que gozava junto ao povo, o que lhe permitia ganhar facilmente todas as eleições de que participou.

Júlio César foi vítima de todo o tipo de acusações, ofensas, calúnias, que se pode imaginar. Poetas escreveram livros repletos de sátiras maldosas sobre sua pessoa. Pra começar, durante toda a sua vida, César foi perseguido pelo boato de que era homossexual, e que, logo no início de sua carreira como militar, prostituíra-se ao rei da Bitínia, Mitilene. Seus adversários abusavam da acusação, descaradamente. Até o elegante Cícero usou a história para fustigar César.

Sabe o que é mais engraçado? É que o povo incorporou alegremente a história, e após as grandes vitórias militares de César na Gália, os soldados festejavam ao redor de fogueiras entoando canções burlescas que falavam de César e Mitilene. E isso sem deixar de dedicar um grande amor a seu líder. E sabe porque amavam César? Porque ele, e só ele, mandou duplicar, a título eterno, o soldo de todos os soldados, ampliou a distribuição gratuita de trigo, mandou construir bibliotecas em todo o império, impôs um ordenamento mais racional ao calendário, fez leis agrárias mais justas, distribuiu terras, baixou o preço dos aluguéis. Enfim, seguiu a máxima que aprendera com seu tio, Mário, que foi o grande líder da esquerda romana: fique sempre ao lado do povo, é dele que vem o poder.

Suetônio narra sem pejo todas as histórias escabrosas em que César se envolveu para conservar o poder. Essa figura tão polêmica, atravessou os séculos com sua reputação incólume apesar das acusações do que fez nos bastidores da baixa política romana. Mesmos os adversários tardios de sua figura atacariam as atrocidades do império romano, não a figura em si de Júlio César, sobretudo porque em vista dos ditadores levianos sanguinários que lhe sucederam, sua história ganharia ainda mais dignidade. O ódio de seus inimigos de então, ao esfaquearem-no covardemente no Capitólio, o transformaria num mártir.

Sem querer estabelecer uma ridícula comparação entre Lula e Júlio César, podemos sempre ver similitudes na história de todas as grandes lideranças populares. Via de regra, são sempre odiados pelas elites da época.

E assim como não foi Júlio César quem inventou a corrupção na república romana, não é Lula inventor do baixo nível das jogatinas políticas de Brasília.

O povo não ama seus líderes porque os consideram santos. Não é assim que nascem os mitos políticos. Ao contrário, a percepção de que seus líderes, para vencerem, precisaram atravessar a mesma odisséia de mesquinharia, inveja, intriga, que experimenta todo ser humano em busca de ascensão social; que tiveram de lidar com pessoas ruins, abafar erros, seus e de seus aliados, conviver com adversários, e sobretudo, cometer muitos equívocos; quando vêem que seu líder também vivenciou tudo isso, aumenta-lhes o amor que lhe dedicam. Admira-se e respeita-se o que os líderes tem de superior, mas o amor, sentimento infinitamente mais poderoso, conquista-se pela afinidade. É assim que admiramos um escritor por seu talento, mas o amamos quando ele se mostra uma pessoa simples, “igual a todo mundo”.

É por isso que os santos são amados por beatas, mas as grandes lideranças políticas são amados pela maioria do povo. Historiadores, por exemplo, com exceção daqueles do Vaticano, não costumam se interessar muito pela vida de São Judas Tadeu e pela conjuntura histórica de sua época; mas figuras políticas, necessariamente polêmicas, como Getúlio e Lula, serão sempre interessantes.

A mídia, portanto, comete um erro fatal ao insistir numa guerra covarde contra Lula. É ótimo que assim seja. Com isso, ela atiça o PT a convocar, finalmente, a CPI da Privataria Tucana; produz um sentimento crescente de indignação contra a manipulação que a mídia faz desse bem público, que é a informação. Se a coisa se limitasse aos jornais impressos, tudo bem, mas atinge rádio e televisão, concessões públicas, produzindo um ambiente constantemente envenenado, interferindo eleitoralmente e até mesmo na estabilidade política do país. Pior, agora temos a prova que a mídia conseguiu aliados perigosos, a cúpula do Ministério Público e a maioria do Supremo Tribunal Federal, gerando em milhares de brasileiros, atentos ao universo das tramóias políticas, o temor de que se repita aqui o vergonhoso golpe branco que assistimos em Honduras. Quando ela ataca figuras menores do PT, o povo assiste a tudo curioso. Quando ataca seu líder, no qual votou, ao qual emprestou – democraticamente – apoio entusiasmado, e que ainda respeita profundamente por tudo que fez ao país, então movimentos sociais, sindicatos, estudantes e trabalhadores, toda a massa heterogênea, que normalmente quase nunca concorda entre si, cerra fileiras em torno de uma só bandeira. Nada melhor como um inimigo em comum para unir as pessoas. Essa união é o preço que a mídia pagará por suas leviandades.

TEXTO RETIRADO DESTE ENDEREÇO:

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Decisões do STF provocam clima de insegurança jurídica


Nos últimos dias cresceram as manifestações pela imprensa de advogados e executivos de empresas e bancos preocupados com os caminhos, as escolhas e as decisões da maioria dos juízes do Supremo Tribunal Federal no decorrer do julgamento da Ação Penal 470, que estariam criando um clima de insegurança jurídica, especialmente por causa do uso feito da teoria do domínio do fato. Uma pergunta repetida é: a jurisprudência originada neste julgamento vai se aplicar a todos daqui para frente ou ela só vale para os réus do "mensalão"?

Marco Aurélio Weissheimer, no Carta Maior


Uma reportagem publicada no jornal Valor Econômico, no dia 13 de novembro, trouxe a público o que vinha sendo tema de preocupadas conversas em gabinetes de executivos de empresas e bancos e também em escritórios de advocacia: os caminhos, as escolhas e as decisões da maioria dos juízes do Supremo Tribunal Federal (STF) no decorrer do julgamento da Ação Penal 470 estão alimentando um clima de insegurança jurídica neste meio, revela a reportagem intitulada“Jurisprudência do mensalão deixa bancos e empresas apreensivos”, de Cristine Prestes e Laura Ignacio. “Qualquer executivo, a partir do mensalão, vai estar muito mais preocupado em assinar qualquer liberação de recursos para evitar o que aconteceu no caso do Banco do Brasil e do Banco Rural”, diz um executivo de uma multinacional que pediu para não ser identificado.

Outro executivo, que também preferiu não ser identificado, disse na mesma matéria: “O risco aumentou, e aumentou muito, porque agora qualquer administrador pode ser condenado por lavagem de dinheiro, sem que tenha tido a intenção de cometer o crime”.Um dos principais motivos de preocupação entre executivos de empresas e de bancos, revela a reportagem, está ligado ao uso que o Supremo Tribunal Federal fez da chamada teoria do domínio do fato.

“Usada pela primeira vez pela Corte para basear uma condenação criminal, ela permite que se atribua responsabilidade penal a quem pertence a um grupo criminoso, mas não praticou diretamente o delito porque ocupava posição hierárquica de comando”, diz a reportagem, lembrando que essa foi a teoria usada para condenar, por corrupção ativa e formação de quadrilha, o ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu.

Ainda segundo a mesma reportagem, o temor de advogados e empresários é que essa leitura da teoria passe a motivar uma série de processos por crimes econômicos contra executivos e gerentes, pela função hierárquica que ocupem nas empresas eventualmente acusadas desses crimes.

Bancos apreensivos

Um dia depois do Valor, foi a vez da Folha de S.Paulo publicar uma matéria afirmando que“a punição rigorosa no mensalão está deixando os bancos apreensivos”. “A pena aplicada pelo Supremo Tribunal Federal a Kátia Rabello (16 anos e 8 meses de prisão), dona do Banco Rural, já está levando a uma reviravolta no setor financeiro e entre as empresas que usam o mercado de capitais para tomar empréstimos”, diz a reportagem assinada por Júlio Wiziack, que conversou com advogados, empresários e bancários, que, assim como aconteceu na reportagem do Valor, só aceitaram falar sob a condição do anonimato.

Defensor de Kátia Rabello, o advogado José Carlos Dias, criticou o tamanho da pena. “Não foi ela quem concedeu os empréstimos. Foi responsável apenas pela renovação de um deles, sem que houvesse desembolso de dinheiro novo”. A pena de 16 anos e 8 meses de prisão, dada pelos juízes do STF, foi baseada na chamada “teoria da cegueira deliberada”. Segundo ela, o gerente ou diretor de um banco não pode liberar recursos que, posteriormente, serão usados em crimes e dizer que “não sabia”. Para o mercado, diz a matéria da Folha, “isso levará a estruturas jurídicas maiores e mais rigorosas porque, de antemão, será preciso vasculhar a vida do cliente e do destinatário”. Isso elevaria os custos e o tempo das operações, que ficariam mais demoradas.

Esse temor, como observa a reportagem do Valor, foi externado durante o próprio julgamento pelo ministro revisor do processo, Ricardo Lewandowski: “Preocupa-me como os 14 mil juízes brasileiros vão aplicar essa teoria se essa Corte não der parâmetros para sua aplicação”. A teoria do domínio do fato é um risco para o ambiente de negócios, disse ao Valor o advogado Eduardo Salomão, sócio do escritório Levy & Salomão Advogados, que presta consultoria jurídica para empresas e mais de 80 instituições financeiras nacionais e estrangeiras. Esse temor é agravado pela leitura que o STF fez da teoria do domínio de fato. Leitura esta que foi criticada por um de seus estudiosos, o jurista alemão Claus Roxin, em entrevista à Folha de S.Paulo.

Um mau uso da teoria do domínio de fato

Claus Roxin criticou o uso dessa teoria para fundamentar a condenação de um acusado apenas pelo fato de sua posição hierárquica, tal como foi feito pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro. “A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção (“dever de saber”) é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso de Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem”, afirmou o jurista, criticando o que qualificou como um mau uso da teoria do domínio do fato.

Roxin também condenou a publicidade e a pressão midiática exercida sob o julgamento. “Na Alemanha, temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública”.

A polêmica sobre os bônus de volume

Outro setor preocupado é o publicitário, por causa da interpretação que o STF fez do mecanismo do bônus de volume. Cinco réus foram denunciados, entre outros crimes, pela prática de peculato referente a desvios dos chamados “bônus de volume” (BV), a comissão paga pelos meios de comunicação às agências de publicidade, conforme o volume de propaganda negociado entre eles.

O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, e os sócios da DNA Propaganda, Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, foram acusados de permitir que a agência se apropriasse de R$ 2,9 milhões repassados como bônus de volume pelos veículos de comunicação. O ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha, foi acusado de possibilitar que a agência SMP&B, dos mesmos sócios, ficasse com os R$ 2,1 milhões dos Bônus de Volume decorrentes da publicidade feita pela casa.

Fontes do mercado publicitário, consultadas pela reportagem da Carta Maior em setembro deste ano, estimaram que, atualmente, cerca de 60% ou 70% do faturamento das agências provenham do BV. A Rede Globo é a maior pagadora do bônus e especula-se que, em 2010, tenha repassado cerca de R$ 700 milhões às agências por meio deste mecanismo. A Editora Abril, que possui o maior faturamento na mídia impressa, teria desembolsado aproximadamente R$ 75 milhões. O que aconteceria se as empresas públicas, a partir das decisões do STF sobre o tema, começassem a pedir a devolução retroativa de bônus de volume pagos às agências de publicidade?

Além disso, o debate sobre o tema no STF expôs essa prática como instrumento que favorece a concentração das inserções publicitárias em alguns poucos veículos, reforçando o oligopólio da mídia. Críticas e fiscais permanentes da destinação de verbas publicitárias públicas para a chamada “mídia alternativa”, as grandes empresas de comunicação têm as suas caixas pretas nesta área, de cujo conteúdo os BV são apenas uma parte. De quanto é, afinal, a participação do setor público (em publicidade, pagamento de bônus ou financiamentos via bancos públicos) na sustentação financeira de grandes grupos midiáticos como Abril, Globo, RBS ou Folha de S.Paulo?

Texto replicado deste endereço:

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O REFERENDUM ISLANDÊS E OS SILÊNCIOS DA MÍDIA

(Carta Maior) - Os cidadãos da Islândia referendaram, ontem, com cerca de 70% dos votos, o texto básico de sua nova Constituição, redigido por 25 delegados, quase todos homens comuns, escolhidos pelo voto direto da população, incluindo a estatização de seus recursos naturais. A Islândia é um desses enigmas da História. Situada em uma área aquecida pela Corrente do Golfo, que serpenteia no Atlântico Norte, a ilha, de 103.000 qm2, só é ocupada em seu litoral. O interior, de montes elevados, com 200 vulcões em atividade, é inteiramente hostil – mas se trata de uma das mais antigas democracias do mundo, com seu parlamento (Althingi) funcionando há mais de mil anos. Mesmo sob a soberania da Noruega e da Dinamarca, até o fim do século 19, os islandeses sempre mantiveram confortável autonomia em seus assuntos internos.

Em 2003, sob a pressão neoliberal, a Islândia privatizou o seu sistema bancário, até então estatal. Como lhes conviesse, os grandes bancos norte-americanos e ingleses, que já operavam no mercado derivativo, na espiral das subprimes, transformaram Reykjavik em um grande centro financeiro internacional e uma das maiores vítimas do neoliberalismo. Com apenas 320.000 habitantes, a ilha se tornou um cômodo paraíso fiscal para os grandes bancos.

Instituições como o Lehman Brothers usavam o crédito internacional do país a fim de atrair investimentos europeus, sobretudo britânicos. Esse dinheiro era aplicado na ciranda financeira, comandada pelos bancos norte-americanos. A quebra do Lehman Brothers expôs a Islândia que assumiu, assim, dívida superior a dez vezes o seu produto interno bruto. O governo foi obrigado a reestatizar os seus três bancos, cujos executivos foram processados e alguns condenados à prisão.

A fim de fazer frente ao imenso débito, o governo decidiu que cada um dos islandeses – de todas as idades - pagaria 130 euros mensais durante 15 anos. O povo exigiu um referendum e, com 93% dos votos, decidiu não pagar dívida que era responsabilidade do sistema financeiro internacional, a partir de Wall Street e da City de Londres.

A dívida externa do país, construída pela irresponsabilidade dos bancos associados às maiores instituições financeiras mundiais, levou a nação à insolvência e os islandeses ao desespero. A crise se tornou política, com a decisão de seu povo de mudar tudo. Uma assembléia popular, reunida espontaneamente, decidiu eleger corpo constituinte de 25 cidadãos, que não tivessem qualquer atividade partidária, a fim de redigir a Carta Constitucional do país. Para candidatar-se ao corpo legislativo bastava a indicação de 30 pessoas. Houve 500 candidatos. Os escolhidos ouviram a população adulta, que se manifestou via internet, com sugestões para o texto. O governo encampou a iniciativa e oficializou a comissão, ao submeter o documento ao referendum realizado ontem.

Ao ser aprovado ontem, por mais de dois terços da população, o texto constitucional deverá ser ratificado pelo Parlamento.

Embora a Islândia seja uma nação pequena, distante da Europa e da América, e com a economia dependente dos mercados externos (exporta peixes, principalmente o bacalhau), seu exemplo pode servir aos outros povos, sufocados pela irracionalidade da ditadura financeira.

Durante estes poucos anos, nos quais os islandeses resistiram contra o acosso dos grandes bancos internacionais, os meios de comunicação internacional fizeram conveniente silêncio sobre o que vem ocorrendo em Reykjavik. É eloqüente sinal de que os islandeses podem estar abrindo caminho a uma pacífica revolução mundial dos povos.


TEXTO REPLICADO DESTE ENDEREÇO:
http://www.maurosantayana.com/2012/10/o-referendum-islandes-e-os-silencios-da.html

terça-feira, 22 de maio de 2012

Manipulação da opinião pública


O filósofo americano Noam Chomsky fala, em uma de suas obras ("Visões Alternativas”) nas estratégias que o sistema (as elites sociais, políticas, econômicas e até religiosas) utiliza para manipular o pensamento das pessoas e assim conformar a opinião geral às suas ideologias.

1. A estratégia da distração - O elemento primordial do controle social é a estratégia da distração, que consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e das mudanças decididas pelas elites sociais, políticas e econômicas. É o que Chomsky chama de "armas silenciosas para guerras tranquilas”.

2. Criar os problemas e depois oferecer as soluções - Este método também é chamado de problema→reação→solução Cria-se um problema, uma "situação” prevista para causar certa reação no público, a fim de que este se torne "suplicante” (clamor) das medidas que se deseja implantar.

3. A estratégia da gradualidade - Para fazer que se aceite uma medida inadmissível, basta aplicá-la gradualmente, a conta-gotas, num prazo alargado.

4. A estratégia do adiamento - Outra maneira de provocar a aceitação de uma decisão impopular é a de apresentá-la com "dolorosa e necessária” (o "cortar na carne”), obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura.

5. Dirigir-se ao público com se ele fosse uma criança - A maioria da publicidade dirigida ao grande público utiliza discursos, argumentos e imagens particularmente infantis, muitas vezes a roçar a debilidade (com desenhos, animaizinhos, criancinhas), como se o expectador fosse uma criança ou um deficiente mental. Um conhecido "âncora” da Rede Globo disse em off, que o brasileiro tem mentalidade de Homer Simpson.

6. Utilizar a emoção acima da reflexão - Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para injetar ideias, e mensagens. Isto acontece em comerciais de tevê, programas políticos, campanhas sociais, aulas e encontros de igreja, etc.

7. Manter o povo na ignorância, alimentando ideais medíocres - A qualidade da educação dada às classes socialmente inferiores deve ser a mais pobre e medíocre possível, de forma que a distância entre estas e as classes altas permaneça inalterada no tempo, e seja impossível alcançar uma autêntica igualdade de oportunidade para todos.

8. Estimular uma complacência com a mediocridade - A vulgaridade, incultura, e o ser mal-falado ou admirar personagens sem talento, estão na moda.

9. Reforçar o sentimento de culpa pessoal - Fazer crer ao indivíduo que ele é o maior (ou único) culpado por sua própria desgraça, por insuficiência de inteligência, de capacidade de preparo ou de esforço.

10. Afirmar que conhecem as pessoas melhor do que elas próprias - Os sistemas de informática "espionam” a vida das pessoas, usuários desses programas. Isto significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce controle e poder sobre os indivíduos, superior ao que eles pensam que realmente tem.

Texto retirado no face de : Nelson Rodrigues